Com a chegada de Amorim vi o Sporting de que tinha ouvido falar, mas nunca tinha vivido. Por alguma razão entre nós, adeptos, o tratávamos como "deus": "olha, deus está a falar" quando Amorim prestava declarações. No final de Maio do ano passado, na celebração no Marquês, Amorim decidiu escalar um novo patamar e mobilizar os adeptos em torno da conquista do tão ambicionado "bi" que, a ser obtido, seria a chancela que confirmaria que o tal Sporting do tempo dos nossos antecessores tinha voltado e para ficar.
Mas não foram apenas os adeptos que se sentiram galvanizados. Jogadores houve que abdicaram de novas carreiras e chorudos contratos pela promessa de um lugar nas páginas imortais do Sporting Clube de Portugal, a quem o próprio Amorim pediu para ficar. A administração arriscou renovações e novos contratos para fazer face ao desígnio que nos era proposto. O desastre da final da Supertaça foi rapidamente soterrado numa memória longínqua e tornada quase irreal pela forma avassaladora como a equipa ia subjugando os adversários, atropelo após atropelo.
A história ainda vai apenas no preâmbulo e muitas linhas estão ainda por escrever. Mas na conferência de imprensa, após o jogo com o Nacional, ficamos a conhecer um Rúben Amorim que ainda não nos tinha sido revelado, apesar dos sinais aqui e ali deixados e preferimos não ver. Como o lamentável episódio da viagem de avião a Inglaterra para acautelar o seu futuro. Ele que tinha contrato em vigor e que dias antes, em conferência de imprensa lançaria um sério aviso aos seus jogadores que o compromisso com o clube e o título ali à mão mereciam prioridade total e que não lhes seriam perdoada distracções, como a procura de novos contratos.
Este novo Amorim é o profissional que - legitimamente, diga-se - ambiciona novos desafios, em paragens onde os recursos abundam e onde comprar os sonhos de grandeza e glória está ao alcance de um excelente treinador como ele é. Mas isso não tem nada de novo. O que houve de novo foi um Amorim enleado no discurso dúbio, com um semblante do miúdo apanhado a mexer na jarra das guloseimas. O Amorim da comunicação exemplar a desmaiar e a desvanecer aos nossos olhos foi um espectáculo triste de se ver. Do gigante que víamos outrora enxergavam-se apenas os pés de barro.
O Amorim que eu idolatrei teria assumido com frontalidade ter recebido uma proposta de um dos melhores clubes do mundo, daquelas que não se pode dizer que não. Este Amorim preferiu esconder que tinha aceitado a proposta e esperava agora a solução que resultará da negociação em curso entre as duas sociedades. Ou então não teria de dizer nada mais do que qualquer coisa como “há um processo em curso sobre o qual não posso tecer considerações, esta é uma conferência sobre o jogo que acabou de decorrer, haverá tempo para falarmos e vos esclarecer".
Sabíamos que este dia chegaria, mas poucos poderiam antecipar que seria assim. Mas foi Amorim que escolheu a forma como decidiu escrever o epilogo de uma relação onde foi acarinhado, idolatrado e tratado como um de nós. Podia sair pela porta 10ª, por onde entrou com o seu célebre “ e se corre bem?”. Mas prefere sair pela garagem com os seus pertences como um vulgar e anónimo passante a quem deu jeito estacionar a viatura no centro de Lisboa.
Amorim entrou como um miúdo inexperiente e sai como um dos técnicos mais promissores do panorama europeu e desejado por muitos. Deve-o a si mesmo, pelas suas qualidades indiscutíveis, mas também o deve ao Sporting, que lhe deu tudo o que estava ao seu alcance e tornou possível para ambos o sucesso que tanto desejavam. Amorim deu o melhor de si, tal como outros que o precederam. Obteve melhores resultados porque era melhor que os demais , mas porque o Sporting também é hoje melhor e está melhor preparado do que estava então. A dívida é por isso mútua, estamos quites.
Nota: Só alguém muito ingénuo poderá pensar que tudo isto aconteceu de um dia para outro, quando se sabe já que o clube de Manchester teve conversas e entregou até propostas escritas a vários elementos do extenso staff técnico-cientifico do clube. Os próximos dias ajudarão a perceber melhor…
Disseste tudo Zé ... agora o importante é o SCP e quem quiser ir connosco à conquista do BI!
ResponderEliminarExcelente texto.
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