segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Um Rugido Leonino


 
Respondendo ao amável convite formulado “a Norte”, deixamos aqui algumas reflexões sobre a nossa visão do Sporting dos nossos dias.

Sendo esta crónica produzida neste momento, não podemos deixar de utilizar como ponto de partida tudo o que se passou na Assembleia Geral de 13 de Outubro, até porque a mesma acaba por ser bastante representativa do que se passa no Sporting Clube de Portugal de há uns anos para cá.

Antes de mais, não podemos deixar de sublinhar que uma decisão tão importante sobre o futuro do clube acabou por ser tomada por um número de sócios que terá rondado o milhar. Além disso, também não podemos deixar de referir que, mais uma vez, o insulto, a falta de civismo e a total falta de racionalidade foram os tópicos dominantes da Assembleia Geral, onde as palavras maioria, minoria, forças de bloqueio e outras que mais foram usadas até á exaustão. A barricada, caros amigos, existe e veio para ficar.

Também não podemos deixar de referir que, mais uma vez, foram tomadas decisões importantes sem as pessoas estarem minimamente informadas e habilitadas para uma votação em consciência. As deliberações tomadas serão boas ou más para o clube? Que consequências terão no nosso futuro colectivo como associação? Permitirão que o Sporting Clube de Portugal continue a ter nas suas mãos a decisão futura sobre o futebol do Sporting? Permitirão que os sócios possam ser opinativos e interventivos no futuro? Nós, com honestidade, não podemos responder a estas questões e, como nós, mais de 95% das pessoas presentes, não saberão responder a estas questões. No entanto, aprovaram as propostas da Direcção, o que nos dá uma imagem assustadora do que é hoje a discussão e a vivencia democrática no Sporting!

Mais assustador que o estado da nossa equipa de futebol é o estado em que se encontra hoje o Sporting Clube de Portugal como instituição. A discussão é inquinada e não é bem vinda, as pessoas são julgadas por ser a favor ou contra a Direcção (esta como a anterior) e não pelo valor intrínseco das suas propostas e das suas ideias, os sócios afastam-se até porque não há grande vantagem em se ser sócio, para quem não tiver o Sporting marcado de forma profunda no ADN como os editores do Rugido, sócios há mais de 30 anos. Nem sequer no preço dos bilhetes para o futebol encontramos vantagens em se ser sócio.

O estádio transformou-se num local frio, onde as pessoas só se reúnem em dia de jogo e mesmo nesses dias são cada vez menos. Quem tem gravadas as memórias do local quente que era o velhinho Alvalade, sempre cheio de gente durante a semana inteira, estranha aquele monte frio de cimento em que se transformou o Alvalade XXI. No antigo estádio existiam as salas da ginástica, a Nave, a piscina na Nave, a sala de sócios, os cafés, os campos de treinos para o futebol ali ao lado. Existiam afinidades, calor humano, sportinguismo…

Este Sporting em certas alturas chega a ser frio como o gelo, cheio de “racionalidade económica”, sem racionalidade humana, sem afectos, sem paixão! E o mais grave é que, ainda por cima, a “racionalidade económica” resvalou num enorme buraco financeiro. Mais grave ainda é que, nas nossas costas, tenha sido delapidado património de uma forma criminosa e leviana. Hoje nada temos e ninguém vai prestar contas por isso. Porque se aceita passivamente que “eles eram boas pessoas, mas correu mal”. CORREU MAL???????

O Sporting da racionalidade económica é hoje um grupo de empresas que, tudo junto, ninguém sabe o que vale. Chegou-se ao ponto de o presidente do SCP não poder revelar as contas do Grupo porque teme as consequências de tal divulgação. As contas da SAD apresentaram um saldo negativo de 13 milhões de euros. As contas do SCP bateram todos os recordes de reservas às contas através da auditoria da KPMG. O resultado líquido negativo de 3 milhões de euros, com base no que se lê nessas reservas, deveria ser, no mínimo 10 vezes pior... E o que nos deixa mais perplexos é o sorriso e a falta de vergonha que as pessoas que lá andam conseguem ter ao apresentar um relatório assim.

O Sporting da racionalidade económica não tem modalidades amadoras de competição (salva-se o andebol e o futsal) mas tem horseball e automobilismo (??????) O Sporting da racionalidade económica não precisa das pessoas que circulavam pelo estádio e aproveitavam para ver o hóquei, o volley e o basket, porque essas também eram partes do seu Sportinguismo! O Sporting da racionalidade económica não tem sequer um pavilhão!

O Sporting da racionalidade económica aceita passivamente um treinador medíocre, que prefere escudar-se em desculpas a lutar pela grandeza do clube. O Sporting da racionalidade económica aceita que se leve 7-1 e 5-0 do Bayern de Munique sem qualquer problema. O Sporting da racionalidade económica aceita a falta de ambição, de garra e de bom futebol, como se o futebol fosse um mero exercício aritmético de orçamentos… O Sporting da racionalidade económica critica o sistema à quarta feira e senta-se com os seus criadores ao domingo numa qualquer Tribuna de Honra do Dragão ou da Luz! O Sporting da racionalidade económica cala-se perante qualquer Pereira ou Guilherme! O Sporting da racionalidade económica não percebe os assobios de quem gosta de bom futebol ou pelo menos de ver garra e entrega! O Sporting da racionalidade económica não percebe porque é que as pessoas cada vez mais ficam em casa!

O Sporting da racionalidade económica tem, no entanto, um Presidente com um vastíssimo C.V. como ficou demonstrado na funesta AG de dia 13! E mais importante que apontar soluções, discutir soluções, ouvir a voz dos sócios que ainda não desistiram de pensar nesta “Madeira á Alberto João Jardim” pintada de verde, é conhecer o CV. do Dr. José Eduardo Bettencourt. Ou de Nobre Guedes! Ou de José Roquete, que é afinal o pai deste monstro!

O futuro que perspectivamos para o SCP terá irremediavelmente que passar por quatro factores decisivos:

i)o futebol do Sporting terá rapidamente que melhorar como espectáculo. Não podemos continuar a oferecer espectáculos de tão pouca qualidade aos que gostam de futebol. Os sócios e adeptos afastam-se progressivamente e tornam cada vez mais difícil a recuperação. Seja através da formação ou do investimento possível, deve-se apostar no futebol de ataque, com muitos golos, com criatividade, com garra e empenho, sem perdas de tempo, sem simulações e sem agressões. O público, sportinguista ou não, deverá gostar de ver o Sporting jogar. Os orçamentos poderão servir de desculpa para não sermos campeões ou por não irmos mais longe na Europa, mas nunca poderão servir de desculpa à falta de qualidade nas exibições do Sporting ou à falta de empenho dos jogadores;

ii)as contas do clube (ou do grupo SCP) deverão rapidamente ser claras e transparentes. Basta de esconder e de enganar os sócios. Ao contrário de outros clubes, o Sporting não pode ser um instrumento de enriquecimento para alguns agentes que gravitam à volta do nosso futebol. Nós, sócios, temos o dever de exigir transparência e competência na gestão. O controlo orçamental deverá ser uma regra incontornável e os planos devem ser feitos com moderação e de acordo com as possibilidades. O crescimento através das receitas deverá ser a trave-mestra da estratégia do clube, de forma a podermos atingir patamares mais altos e mais ambiciosos;

iii) o SCP deverá assumir um papel de liderança na mudança do futebol português. Basta de ver uma Liga Portuguesa onde imperam as más arbitragens, uma justiça desportiva morosa e incapaz, os dirigentes corruptos ou incompetentes, os treinadores sem qualidade e que jogam para o empate, os jogadores que simulam ou queimam tempo, as claques violentas que afastam as famílias do espectáculo, os estádios vazios com bilhetes excessivamente caros, uma televisão que manda nos horários e que paga muito abaixo dos outros campeonatos europeus e os agentes que escolhem jogadores para os clubes e enriquecem à conta das comissões. O futuro do Sporting passa pelo estado do futebol português, e se os outros vivem bem nesta conjuntura, deveremos ser nós a lutar por alterá-la.

iv)O Sporting deverá continuar a ser decidido pelo Sporting, ou seja pelos seus sócios. Seja o Sporting das amadoras, das contas ou do…futebol! Será que ainda vamos a tempo de cumprir esta premissa?

Actualmente dói andar pela rua e, apesar de tudo, ver tantos miúdos de idade tenra vestidos à Sporting! Está ali o futuro deste clube e ele ainda existe. Basta sair à rua e contar os miúdos que vemos de verde e branco. Mas que Sporting temos para lhes entregar? Cabe-nos a nós decidir!

Rugido 
*Texto da autoria de RugidoLeonino  para o "ANortedeAlvalade"  no âmbito da nossa iniciativa "Reflexão Leonina". 

10 comentários:

  1. Caros amigos JG e MRL

    Muito Bom…

    Como sabem, ao longo do (principalmente) último ano e meio venho trocando argumentos no Rugido, aqui a Norte e por outros lados da blogosfera leonina. E não posso deixar de considerar que partilho das vossas preocupações, aqui agrupadas e manifestadas.

    As últimas AG's têm sido realmente funestas. Apesar de não as viver directamente (parece que não há vontade em permitir a participação aos sócios que moram longe de Lx), chego a essa conclusão pelas situações e tb decisões que de lá transparecem… É triste ver o SCP a insistir num rumo que já tão maus resultados deu no passado. Estas fugas para a frente sem uma reflexão estritamente necessária são penosas. Até jjá tenho a sensação de que nem quem apresenta as Propostas de Reestruturação Financeira (já foram tantas…) parece realmente convicto de que irão surtir os efeitos desejados… Dia 13 de Outubro foi mais um exemplo. Apresentou-se um Plano á pressa, sem explicações, sem esclarecimentos.E votou-se, aprovando-se, porque sim… Porque acredita-se em JEB… No seu cv, na sua simpatia, na sua suposta diferença para os seus antecessores. Votou-se por uma questão de fé, mais um salto no escuro…

    O futuro… apresenta-se incerto… Agora estamos todos a rezar para que desta vez o Plano resulte… Ou que pelo menos consiga efectivamente restringir os danos financeiros e económicos que o SCP vem apresentando… Vamos aguardar que o estado do futebol melhore; que melhorem os espectáculos e as assistências; que definitivamente a transparência das e nas contas prevaleça; que finalmente os nossos dirigentes se empenhem e demonstrem a coragem que tão arredia tem estado de Alvalade; Que seja desta vez q o pavilhão efectivamente avança; que o SCP continue a ser dos sportinguistas e que os seus sócios tenham uma palavra a dizer sobre o seu futuro… no futuro.

    Parece um conjunto de tarefas ciclópicas… Mas resta-nos ter esperança de que se melhore… E que os filhos dos miúdos que hoje vamos vendo pelas ruas vestidos de verde e branco tenham ainda os sentimentos de orgulho e paixão que nós qd atingirem a nossa idade…


    Gde abraço, caros amigos! Parabéns pelo post e muito obrigado.

    SL!

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  2. Começo por agradecer a participação do Rugido nesta iniciativa.

    É sem dúvida um ponto muito importante a 1ª questão levantada. Como podem decisões tão importantes, venham elas ou não de encontro ao que preconizo, serem tomadas por um número tão reduzido de sócios. Lembro que , p.ex., registando-se uma abstenção superior a 50% os referendos deixam de ter carácter vinculativo.

    Não estive na AG (faço minhas as palavras do Virgílio) mas não me surpreende o relato feito, corroborado por várias fontes, do ambiente vivido que mais não é do que o que regista na blogosfera, p.ex.
    Também acho que ninguém sabe para onde vamos mas nisso o Sporting mais não é do que o espelho da sociedade onde se insere: quem é eleito raras vezes é confrontado pelos eleitores. O exercício de cidadania é malquisto, e quem o faz logo é carimbado e ostracizado. No caso concreto do nosso clube os dirigentes estão lá com a nobre missão de servir os interesses do clube, honra que lhes foi concedida pelos seus consócios. Julgo que a maior parte de nós acha que votar é tudo, ler relatórios, percebê-los ou buscar informação é uma maçada. Ainda assim vamos para frente que eu confio neles. O resultado tem-se visto.

    O Sporting é o que é hoje e não sei se já vimos o fundo ao poço. Seja nas exibições da equipa, seja no passivo astronómico, seja na forma como a impunidade se instalou em Alvalade. Já tínhamos pensado que tínhamos visto o pior ante o Olhanense, veio o Belenenses e depois o Vetspils a desmentir. Sobre o passivo a afirmação do Presidente diz tudo sem dizer nada.

    É possível inverter este panorama? Creio que sim. Aliás sempre fomos conhecidos por ser diferentes e optimistas especialmente quando andamos arreados das vitórias quase 2 décadas. É preciso falar verdade ao invés de ocultar. É preciso apurar as nossas capacidades ao invés de arranjar desculpas. Fazer melhor com menos dinheiro é um desafio. Comprar tudo feito pagando sem olhar ao preço é de novo rico e o nosso clube deveria continuar a ser visto como um clube aristocrático. Não no que a definição tem de pejorativo, mas definidora de um comportamento distinto e nobre. Afinal foi assim que chegamos a ser diferentes para melhor. Não queiramos imitar os outros sendo piores.

    Abraço ao Rugido.

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  3. Caros amigos,

    O excesso de racionalidade trazida para dentro do nosso Sporting acabou por retirar do mesmo tudo aquilo que ao longo de muitos anos o alimentou: A paixão.

    Certo é que hoje em dia, aquilo a que chamamos ou que nos tentam vender como "racionalidade" já não passa da redução de tudo a níveis mínimos: capacidades, compreensão, qualidade, exigência, etc.

    Saudações Leoninas aos companheiros JG e MRL

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  4. Gostava de acrescentar que o "SCP da racionalidade económica" nos trouxe o fim de um grande jejum de quase 2 décadas, mas está-nos a fazer pagar com "lingua de palmo" cada grito de vitória.

    o "SCP da racionalidade económica" também nos levou o basquetebol e quase fez desaparecer o ecletismo que no período em que o futebol viveu a mingua de vitorias fez com que o SCP fortalecesse o seu estatuto de grande clube mundial ao nível do numero de títulos alcançados. Não ganhavamos no futebol mas o nome do Sporting, por força das modalidades, não ficou na penumbra.

    Se pelos próximos 2 títulos nacionais e taças tivermos que acrescer mais 3 centenas e meia de milhão de passivo (não teremos que construir um novo estádio para que a relva não definhe?) comemoraremos o último titulo e os nossos adversários a nossa extinção.

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  5. Caríssimos, algures pelo caminho no meio do entusiasmo dos fantasticos projectos empresariais que nos venderam, nós esquecemos o que é o Sporting. Um Clube Desportivo!

    E esquecemos quem constroi o Sporting. Os sportinguistas! Aqueles que amam, que gritam, que choram, que vibram, que sentem. Aqueles que têm verde nas veias, mas a quem hoje até é negado o direito de ter um papel no futuro do objecto da sua paixão!

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  6. Rugido,

    Ainda bem que participaram e logo com um post deste nível. Pouco tenho para dizer que o post não refira e que não tenha sido complementado pelo Virgílio, LdA e pelo Hugo.

    Neste momento, como nunca vi antes, há muitos Sportinguistas que já nem vibram com as vitórias do SCP e isso não tem nada a ver com o ser-se Sportinguista ou não. Os sinais estão aí para quem os quiser ver e compreender...

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  7. desculpem trazer para aqui uma conversa antiga.

    Sobre o Manuel Machado.

    Revejam os golos do Benfica (em especial o 1º, q surge qd teoricamente deveriam estar melhor organizados). As defesas do Machado é só buracos. Não há linhas definidas. Andam atras do adversario à doida no campo. É aleatorio... Ele jamais será bem vindo ao Sporting.

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  8. Amigos, venho aqui deixar o link de um novo espaço onde se pretende meter a nú toda a verdade sobre o universo Sporting!
    http://estesportingfornever.blogspot.com/
    Abraços

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  9. PB, já tinha lido o teu post, tens toda a razão, isto sem o Néné é muito mais complicado...

    Caso o Sporting queira um treinador nacional, só tem de escolher e não me parece que Machado seja sequer uma possibilidade, ainda não vi nenhuma equipa a melhorar "só" pela sua entrada.

    E repito não há treinador nacional que esteja fora do alcance do Sporting.

    P.S.- Eu sei que me vão dizer que há uma excepção, mas essa para mim não é uma possibilidade em Alvalade por razões directamente imputaveis ao próprio.

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