sexta-feira, 8 de março de 2013

João Rocha fica bem ao lado de José Alvalade (II)

Quando foi tornada  pública a feliz e justa ideia de que o nome do futuro pavilhão fosse atribuído a João Rocha coloquei aqui um post com o titulo João Rocha fica bem ao lado de José Alvalade. Hoje, sem ser surpreendido pela noticia do seu desaparecimento, mas sendo inevitavelmente colhido pela tristeza, re-publico essas palavras que mais não são do que uma muito singela mas sentida homenagem a um homem que é bem capaz de ser um dos maiores responsáveis pelo meu Sportinguismo. 

João Rocha desaparece do nosso convivio mas não morreu. Há muito que assegurou um lugar na galeria dos imortais do nosso clube, muito antes de nos deixar hoje a todos tristes.

João Rocha chegou ao Sporting num momento de profunda crise directiva, sem que ninguém quisesse assumir a presidência. O presidente Valadão Chagas havia sido eleito no dia  29 de Março de 1973 mas abandonaria o cargo no dia seguinte (!) à tomada de posse, 4 de Abril, em direcção ao governo de Marcelo Caetano, deixando na gestão interina o seu Vice-Presidente Manuel Nazareth. Este havia deixado bem claro que não tinha vontade nem ambição para o cargo. A crise estender-se-ia até Setembro desse ano, mais propriamente até  dia 7, quando João Rocha chega à presidência do clube.

Quando tomou posse João Rocha, que era até um sócio relativamente recente, de imediato revelou a ambição que o trazia: "Julgo que se deu uma nova tomada de consciência, um certo empolgar da alma colectiva. Fascina-me a ideia de erguer uma grande obra, apoiada por milhares ou milhões de pessoas e que possa representar uma viragem nos nossos clubes desportivos".  Palavras essas que seriam materializadas por inteiro nos 13 anos em que presidiu ao clube.

Foram nesses anos que o Sporting saiu da letargia em que se encontrava para dos pouco mais de 40 mil sócios chegar aos 130 mil. O período de João Rocha ficou assinalado por mais de 1200 títulos nacionais, 52 Taças de Portugal, 8 Taças dos Campeões Europeus de Corta-Mato, uma Taça dos Campeões Europeus, duas Taças das Taças, uma Taça CERS em Hóquei em Patins. O Sporting chegou a movimentar cerca de 15000 atletas em 22 modalidades! O nome do Sporting chegou a todo mundo quando Carlos Lopes ganhou a primeira medalha de ouro nuns Jogos Olímpicos. Entre 1981 e 1985 realizaram-se quatro(!) Congressos Leoninos, em Lisboa, no Rio de Janeiro, em Toronto e na Madeira e nos Açores! Pode-se dizer com propriedade que o Sporting viveu uma verdadeira refundação.

Uma marca da passagem de João Rocha pelo Sporting foi sempre a sua quase omnipresença junto das diversas equipas e atletas, fossem quais fossem as circunstâncias. Manuel Fernandes, o grande capitão, testemunhou-o, depois de lhe oferecer a sua camisola, quando em 1982 acabava de conquistar a dobradinha, vencendo a Taça de Portugal no Jamor: "O presidente merece. Tem-nos acompanhado nos bons e nos maus momentos, Quando perdemos vai às cabines e moraliza-nos: Chega inclusive a fazer-nos vento com a toalha...".

Foi no futebol que João Rocha conheceu mais dificuldades. Nos 13 anos de mandato ganhou apenas três Campeonatos Nacionais, três Taças de Portugal e uma Supertaça. A isso não será alheio o aparecimento de Pinto da Costa. Sustentado numa estratégia de quem percebeu que o futebol português suporta a muito custo a existência de mais de 2 grandes clubes, o ainda presidente do FCP elegeu como primeiro alvo o Sporting, contra quem foi travando as suas primeiras grandes batalhas. Ficou célebre a sua frase após mais uma acesa disputa com João Rocha: "enquanto eu for presidente o Sporting não voltará a ser campeão!". Hoje sabemos (como e porquê) que apenas por 2 vezes a sua vontade não foi cumprida.

Não se pense que apesar do indiscutível sucesso que João Rocha não conheceu oposição à sua passagem. Nesse âmbito foi estrepitosa e nem sempre de bom tom a disputa das eleições de 1982 com Marcelino de Brito. Como ficou célebre a crise provocada em 1980, em que desafiou uma oposição que moía mas não dava a cara, como se provou ao ter que concorrer sem adversários. Eram também muitas as suas queixas relativamente às dificuldades causadas pela falta de compreensão da tutela na resolução da sustentabilidade financeira dos clubes. Por isso dizia já há muito "É preciso redefinir o clube e encontrar uma filosofia que permita ao Sporting seguir em frente sem o perigo de fechar a porta."

O problema da sustentabilidade financeira era algo que já preocupava João Rocha desde a sua tomada de posse. Antecipando em muitas décadas as SAD´s, criou a Sociedade de Construções e Planeamento que em 9 de Março de 1974 emitiu 2.500.000 acções de valor nominal de 100 escudos. Esta, tal como todas as outras cotadas em bolsa, haviam de se esfumar passado pouco mais de um mês com o advento da revolução dos Cravos, em Abril de 1974.

Foi já cansado e doente que em 1986 João Rocha abandonaria a presidência do Sporting, abrindo um período em que, de forma paulatina e por vezes acelerada se foi desbaratando muito do que foi construído. Hoje, passados estes anos, ocorre-me que a saída de João Rocha nunca foi querida e muito menos preparada.

Não sei se João Rocha foi o melhor presidente de sempre do Sporting porque, nos seus recentemente celebrados 106 anos de vida, há muito da sua história que não foi vivida e testemunhada. Por isso não gostaria de cometer o habitual erro de paralaxe de quem observa a história separada por diferentes ângulos de observação. Mas João Rocha é hoje considerado, e com toda a justiça, um dos maiores presidentes da história do Sporting e ao seu tempo de presidência corresponde um dos períodos mais pujantes da nossa história.

Seja ou não atribuído o seu nome ao pavilhão a construir nas imediações do estádio (felizmente temos uma história rica e com muita gente merecedora da distinção ) esse é um facto que a história se encarregará de confirmar. Mas se tal ocorrer só posso dizer que o nome de João Rocha ficará muito bem ao lado do estádio que tem o nome de José Alvalade.

10 comentários:

  1. Cresci a amar o SCP com João Rocha a presidente. Mt do que eu sou hj, enquanto Sportinguista, a ele se deve. Obrigado e até sempre caro PRESIDENTE!! E agora que nos deixa ainda mais orfãos, olhe por tds nós, aí para onde partiu...

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  2. Uma referência da nossa familia. Um Sportingista de sempre! Não era nem verdadeiro, nem puro, nem blá-blá, era de sempre e estará na nossa memória para sempre!

    Obrigado, tentarei seguir o exemplo.

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  3. Ando há muito arredado das "conversas" nos blogues. Mas hoje impõe-se lembrar a pessoa e o legado desse Enorme Presidente do Sporting.

    O seu exemplo deveria ter sido a referência de todos os que se sentaram naquela cadeira e deve ser o farol de todos os que ali se querem sentar.

    Sentidas condolências à família e que descanse em Paz.

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  4. Também não posso dizer que terá sido o melhor Presidente da História do Sporting. Mas posso dizer que foi o melhor e mais importante Presidente do Sporting que conheci. Nos últimos quarenta e muitos anos ninguém se lhe comparou. Os que lhe sucederam moveram-se num sentido diferente e que se revelou um sentido trágico que conduziu o Sporting à situação de pré-colapso em que está mergulhado. Quando Roquette tomou conta do Sporting proferiu uma frase que se revelou trágica. Pretendia ele tornar o destino do Sporting independente da bola que bate na trave e não entra. Podemos hoje afirmar com tristeza que conseguiu. Mesmo que a bola entre o destino do Sporting afigura-se negro. Como tudo teria sido diferente se João Rocha tivesse permanecido mais uns anos à frente do clube. Talvez Pinto da Costa tivesse engolido o que então afirmou.

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  5. Recordar uma resposta na última entrevista de João Rocha ao Jornal do Sporting.

    "Esteve na presidência do Sporting de 1973 a 1986. Como chegou à liderança do Clube?

    O Sporting passava por uma crise económica e de sobrevivência. Brás Medeiros pediu a demissão, depois Valadão Chagas esteve como presidente do Sporting durante 48 horas. Antes, alguns dirigentes do Vitória de Setúbal foram ao meu escritório pedir-me para ser presidente, mas disse-lhes que não estava fadado para um cargo noutro clube. Uns dias mais tarde, o professor Adelino da Palma Carlos, meu grande amigo, propôs-me que avançasse para a presidência do Sporting e após larga insistência, fomos então fazer um levantamento da situação financeira do Clube. Acabei por aceder, entrando com a ambição de dinamizar o Clube e torná-lo a maior potência desportiva nacional. Lembro-me de que o Clube tinha menos de 20 mil associados e, treze anos depois, tinha cerca de 136 mil. Houve alturas em que, numa semana, eram inscritos cerca de três mil sócios, um exemplo de como o Clube cresceu em termos de sportinguistas filiados."

    O LdA tem dissecado brilhantemente o momento actual do Sporting nos últimos dias. Esta radiografia não é melhor nem pior que noutros tempos. É grave como quase sempre foi. Mais do que projectos o Presidente ideal será o que tiver um objectivo simples como tinha João Rocha “...dinamizar o Clube e torná-lo a maior potência desportiva nacional.”.

    Sem sonho não há futuro, as dívidas pagam-se da mesma forma que se fazem, um euro de cada vez, mas fundamental para ser eterno é construir no presente os alicerces onde vai assentar a Glória.

    De tanto banalizar o nosso lema, de andarmos cegos com a Glória, esquecemos que antes dela há três palavras que identificam os pressupostos fundamentais para a alcançar. A Glória não se compra.

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  6. Um Homem simples,mas incomparável no exemplo que transmitia a todos nós da sua capacidade de trabalho e de mobilização dos Sportinguistas.Batalhou contra os poderes instituídos,(que agora ressurgem)quer interna ou externamente,nunca se vergando ao "sistema" que na época tendia a mudar de côr.Foi amado por quase todos os nossos associados,mas traído por alguns que o bajulavam.A sua morte deixa-nos muito mais pobres e a mim com um sentimento de perca,como se de um familiar meu se tratasse.Creio firmemente que no sítio onde se encontrar jamais deixará de "olhar" pelo seu e nosso SPORTING.À família enlutada as minhas sinceras condolências.

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  8. Costuma dizer-se que as pessoas passam e o clube fica. João Rocha conseguiu ultrapassar essa barreira no Sporting.
    Do meu tempo de vida, há 2 nomes que ligarei eternamente ao meu amor ao Sporting. O Manuel Fernandes será sempre o meu Capitão e o João Rocha será sempre o Presidente.
    RIP João Rocha.

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