Afinal, os deuses talvez gostem do Sporting
Que grande clube é este que se serve do mesmo pó onde se prostrou há um ano, derrotado, para o deixar agora por muito tempo no ar no vale do Jamor, após as celebrações de uma vitória de raça, querer e fibra? Que grande clube é este que, sem grandes conquistas, continua a levar atrás de si uma legião de adeptos fervorosos de todas as faixas etárias que, mais do que troféus, celebram o amor pelo clube que idolatram? Estas devem ser algumas das perguntas que estarão a fazer quem presenciou o espectáculo dentro do espectáculo que constituiu mais esta passagem do Sporting pelo Estádio Nacional.
Esta final constituía uma oportunidade que o Sporting não podia desperdiçar para rectificar a imagem deixada na última passagem pelo Estádio Nacional: um clube esfrangalhado e, pior que derrotado pelos adversários, um clube que se vencia a si mesmo. Poder fechar um ciclo tão negativo como o que foi vivido no último ano, com duas vitórias em três possíveis nas competições nacionais, oferecia a possibilidade de encarar o futuro próximo com mais serenidade e equilíbrio, algo que tanta falta nos tem feito nestes últimos tempos.
Se há alguma ilação a retirar da conquista da Taça de Portugal é que o Sporting está longe de terminar a época com um plantel equilibrado, mesmo considerando que os acertos feitos em Janeiro trouxeram mais e melhores opções. Porém, teria sido preciso muito mais dinheiro e ter escolhido de forma eximia para anular os estragos deixados pelos acontecimentos do verão passado. E provavelmente não haveria tempo para fazer a indispensável integração de um número mais elevado de jogadores.
Ainda assim o Sporting dispensou Lumor, Marcelo, Misic, Matheus, Bruno César, Nani, Castaignos e Freddy Montero, num misto de necessidade pelo aperto financeiro ou por total erro de casting de alguns desses atletas. Os nomes que avançaram no seu lugar causaram em primeiro lugar desconfiança. Tiago Ilori era (ou ainda é...) um nome quase proscrito pela forma como havia saído, acrescido por um trajecto sem confirmação do potencial. Borja, Idrissa Doumbia e Luiz Phellype eram nomes praticamente desconhecidos do grande público - mais os dois últimos - não suscitando por isso grande entusiasmo. Paradoxalmente, o resgate de Francisco Geraldes parecia o movimento mais promissor para um meio campo sem grandes soluções, que acabou contudo com quase zero minutos jogados.
Borja viu-se afastado da final no último jogo do campeonato. Mas Idrissa Doumbia e Luiz Phellype acabaram por ter parte activa na conquista do troféu. Especialmente o ponta-de-lança brasileiro que, ao marcar o penalty decisivo, termina a meia época de estreia de forma ascensional, reduzindo a pó as criticas que a sua contratação havia gerado, tais como as dúvidas sobre o seu valor.
Mas há uma outra ilação obrigatória: no carácter e na determinação com que se bateram contra ex-campeão, que figurou este ano ano lote das oito melhores da Europa, residiu uma das razões para este feito, que muitos consideravam improvável. Não só agora na final, mas já na eliminatória anterior, onde eliminaram de forma justa e inapelável o actual campeão em titulo.
Talvez as maiores dúvidas se concentrassem ainda mais acima. Na capacidade de Frederico Varandas em liderar um clube estilhaçado pelos acontecimentos e consequências de um final de época 17/18 de terror. E na aptidão e talento de um desconhecido e de folha curricular quase vazia como Marcel Keizer. Ora o que decorre da assunção do risco de contratar o treinador holandês, tal como já havia feito ao avançar para a liderança do clube, quando podia ficar confortavelmente no gabinete médico, é que a Frederico Varandas não falta nem convicção nem coragem. Aquilo que parecia um acto mal ponderado é agora o seu salvo conduto para a preparação da próxima época. O mesmo se pode dizer para Keizer que, apesar de o futebol exibido na final estar longe ser sedutor ou uma referência, tem a seu favor os títulos que exibe em cada uma das taças conquistadas. A descrição com o que o consegue contrasta com a pompa e o luxo de outros bem-falantes que o precederam no lugar e o abandonaram com muito menos ou nenhuns troféus para o exibir.
Afinal talvez os deuses do futebol gostem do Sporting. O que parecia há um ano ser um clube amaldiçoado e destinado a sucumbir por dentro, ganhou de forma surpreendente um novo fôlego. Longe ainda de ter afastado os maus presságios ou o contravapor interno recalcitrante de algumas almas inconformadas com o final ruinoso da gestão anterior, o Sporting parece ter agora uma estrutura mais sólida e um grupo de trabalho focado, coeso e saudável, condições indispensáveis para competir ao mais alto nível. Mas talvez o mais importante de tudo, o direito a voltar a ter esperança e, por via disso, a ambição de um clube grande que é e que no Jamor os seus adpetos fizeram gáudio em demonstrar.
Nota: artigo escrito para o site Fairplay
Esta final constituía uma oportunidade que o Sporting não podia desperdiçar para rectificar a imagem deixada na última passagem pelo Estádio Nacional: um clube esfrangalhado e, pior que derrotado pelos adversários, um clube que se vencia a si mesmo. Poder fechar um ciclo tão negativo como o que foi vivido no último ano, com duas vitórias em três possíveis nas competições nacionais, oferecia a possibilidade de encarar o futuro próximo com mais serenidade e equilíbrio, algo que tanta falta nos tem feito nestes últimos tempos.
Se há alguma ilação a retirar da conquista da Taça de Portugal é que o Sporting está longe de terminar a época com um plantel equilibrado, mesmo considerando que os acertos feitos em Janeiro trouxeram mais e melhores opções. Porém, teria sido preciso muito mais dinheiro e ter escolhido de forma eximia para anular os estragos deixados pelos acontecimentos do verão passado. E provavelmente não haveria tempo para fazer a indispensável integração de um número mais elevado de jogadores.
Ainda assim o Sporting dispensou Lumor, Marcelo, Misic, Matheus, Bruno César, Nani, Castaignos e Freddy Montero, num misto de necessidade pelo aperto financeiro ou por total erro de casting de alguns desses atletas. Os nomes que avançaram no seu lugar causaram em primeiro lugar desconfiança. Tiago Ilori era (ou ainda é...) um nome quase proscrito pela forma como havia saído, acrescido por um trajecto sem confirmação do potencial. Borja, Idrissa Doumbia e Luiz Phellype eram nomes praticamente desconhecidos do grande público - mais os dois últimos - não suscitando por isso grande entusiasmo. Paradoxalmente, o resgate de Francisco Geraldes parecia o movimento mais promissor para um meio campo sem grandes soluções, que acabou contudo com quase zero minutos jogados.
Borja viu-se afastado da final no último jogo do campeonato. Mas Idrissa Doumbia e Luiz Phellype acabaram por ter parte activa na conquista do troféu. Especialmente o ponta-de-lança brasileiro que, ao marcar o penalty decisivo, termina a meia época de estreia de forma ascensional, reduzindo a pó as criticas que a sua contratação havia gerado, tais como as dúvidas sobre o seu valor.
Mas há uma outra ilação obrigatória: no carácter e na determinação com que se bateram contra ex-campeão, que figurou este ano ano lote das oito melhores da Europa, residiu uma das razões para este feito, que muitos consideravam improvável. Não só agora na final, mas já na eliminatória anterior, onde eliminaram de forma justa e inapelável o actual campeão em titulo.
Talvez as maiores dúvidas se concentrassem ainda mais acima. Na capacidade de Frederico Varandas em liderar um clube estilhaçado pelos acontecimentos e consequências de um final de época 17/18 de terror. E na aptidão e talento de um desconhecido e de folha curricular quase vazia como Marcel Keizer. Ora o que decorre da assunção do risco de contratar o treinador holandês, tal como já havia feito ao avançar para a liderança do clube, quando podia ficar confortavelmente no gabinete médico, é que a Frederico Varandas não falta nem convicção nem coragem. Aquilo que parecia um acto mal ponderado é agora o seu salvo conduto para a preparação da próxima época. O mesmo se pode dizer para Keizer que, apesar de o futebol exibido na final estar longe ser sedutor ou uma referência, tem a seu favor os títulos que exibe em cada uma das taças conquistadas. A descrição com o que o consegue contrasta com a pompa e o luxo de outros bem-falantes que o precederam no lugar e o abandonaram com muito menos ou nenhuns troféus para o exibir.
Afinal talvez os deuses do futebol gostem do Sporting. O que parecia há um ano ser um clube amaldiçoado e destinado a sucumbir por dentro, ganhou de forma surpreendente um novo fôlego. Longe ainda de ter afastado os maus presságios ou o contravapor interno recalcitrante de algumas almas inconformadas com o final ruinoso da gestão anterior, o Sporting parece ter agora uma estrutura mais sólida e um grupo de trabalho focado, coeso e saudável, condições indispensáveis para competir ao mais alto nível. Mas talvez o mais importante de tudo, o direito a voltar a ter esperança e, por via disso, a ambição de um clube grande que é e que no Jamor os seus adpetos fizeram gáudio em demonstrar.
Nota: artigo escrito para o site Fairplay