O Sporting é o Sporting, vive-se, sente-se, ama-se. Poderemos até estar cansados de ama-lo (eu estou cansado), mas o Sporting é imortal e far-nos-á voltar sempre a casa, sem sermos filhos pródigos.
Mas, o Sporting está pejado de filhos pródigos. Escuso-me a contar a parábola do filho pródigo, sobejamente conhecida de todos, mas olhando bem para Alvalade, não podemos deixar de constatar a abundância daqueles que vão e regressam em nome do seu próprio interesse, servindo-se sem servirem o Clube que os vai acolhendo.
O Sporting somos nós e sem nós não há Sporting. Quem somos nós? Os que pagamos as quotas, os que percorrem o país e a Europa a apoiar o clube, os que se dignam a ir às Assembleias Gerais, os que compram ou assinam o Jornal do Clube, os que vão fazendo pequenos sacrifícios em prol do seu sentimento, vivência e amor inexplicável, o Sporting.
Depois, há os tais filhos pródigos, Sportinguistas que gostam de percorrer os corredores do poder de Alvalade, não para tornar o Clube mais forte e competitivo, mas apenas porque é fino percorrer esse corredor, é fino ser-se do Sporting, além de dar jeito para a concretização de interesses e negócios que a todos servem, menos ao Sporting.
O meu negócio quando vou à bola, é beber umas cervejas com os amigos, torcer pelo Clube e regressar a casa, feliz da vida ou com uma cachola do caraças, como vem sendo hábito ultimamente. Diferentemente, há quem fume um bom charuto (nada contra) e vá vendo o jogo sem o mesmo fervor do adepto, porque o que mais lhe interessa é ser visto, falar com fulano e sicrano em prol do suposto interesse ou negócio. A bola não é um prazer, mas sim um álibi, um trampolim para algo mais do que o simples orgasmo que um golo leonino pode provocar.
É verdade que tanto a blogosfera como a imprensa estão carregadas de crónicas e dissertações sobre o momento actual do clube, momento esse que perdura e teima em manter-se actual. Num mundo cada vez mais volátil é interessante verificar que em Alvalade está tudo na mesma de há uns anos a esta parte, ou seja, tudo decadente, sem alma, sem crença nem glória. Não vou entrar na discussão já estafada, sobre os conhecidos problemas que estão a matar o Sporting.
Na Revista do Expresso da semana passada, o Presidente do FCP, Pinto da Costa, concedeu uma interessante entrevista, onde, entre outros temas, abordou as relações com os rivais. Já não há rivais. Apenas há um rival. O Sporting? Esses “são nossos amigos”, referiu o edil Portista.
Pinto da Costa tornou o seu Clube no segundo grande e afastou-nos para terceiro por muito que nos custe admitir. Tratou-nos quase sempre como amigos, ao longo dos anos, adormecendo-nos e explorando ao máximo a nossa rivalidade histórica com o velho rival. Nós, (os filhos pródigos de Alvalade) foram quase sempre na cantiga. O resultado está bem à vista de todos. Pinto da Costa sairá do FCP quando este ultrapassar o SLB em número de troféus conquistados e morrerá com a esperança de que o seu neto pode vir a pertencer ao maior Clube Português, mesmo em número de adeptos.
O Sporting, por razões históricas derivadas do seu código genético, jamais poderia pautar a sua actividade mediante determinadas práticas menos éticas, nada condizentes com os valores e pergaminhos do Clube que sempre se soube diferenciar dos seus rivais quanto à postura social e desportiva dentro e fora das quatro linhas.
Isso é legítimo, admirável, defensável e devemos continuar a pugnar pela verdade, pela irradiação dos apitos, dos túneis e da fruta do futebol português, que está falido e com a reputação pelas ruas da amargura. Não significa isso que se abandone a cruzada contra o sistema conhecido, outrora liderada por nós, que não se tenha posição sobre nada, continuando a ser anjinhos, completamente apáticos, parecendo que nada importa, mesmo quando está em causa a defesa dos nossos mais elevados interesses do Clube.
Parece que já não contamos, somos constantemente ignorados, ninguém nos teme, ninguém nos passa cartão. Tornou-se banal ganhar um jogo ao Sporting, tornou-se banal prejudicar o Sporting, tornou-se normal tratar mal o Sporting, porque quem representa o Clube, pouco ou nada se importa com isso nem nada parece estar a fazer de forma assertiva para alterar esta penosa situação que se abateu em Alvalade.
20.057 almas, estiveram quinta-feira em Alvalade num jogo europeu. Eu estive lá. Fiz meia dúzia de telefonemas a amigos, antigos companheiros de lugar em Alvalade, todos sócios, todos residentes na área de Lisboa. Nota dominante: todos continuam sócios, todos pagam quotas, nenhum vai a Alvalade. Estão realmente cansados de amar este Sporting. Estão cansados de se deitar e acordar no dia seguinte com o sabor amargo da derrota, do desvario, da falta de rumo e de horizonte, precisamente aquilo que no "nosso amigo" a norte não se passa.
O Sporting como o conhecemos, parece já não existir, parece estar a morrer, padecendo de uma doença crónica que todos os dias vai comendo um pouco mais da nossa alma. É todo o pomar que parece estar podre.
É mau de mais, como diz Santana Lopes, o homem que tem medo dos elevadores do dragão, "responsável" pela debandada de milhares de sócios quando foi Presidente do nosso Clube.
Mas o nosso Sporting existe, ainda vive, não precisa de ser ressuscitado, porque não morreu. Não estamos reduzidos às cinzas do antigo estádio que parece que nos levou a alma e a mística. A morte de Alvalade parece ser uma certeza para muitos. Pior do que isto parece-nos difícil, mas a verdade é que continuamos a escorregar para o fosso a cada dia que passa. Não haverá reestruturação financeira que nos valha se continuarmos reduzidos a este fosso, a este vazio, a este penoso caminho.
Há quem acredite na morte do Sporting. Nós podemos salvar o Sporting. Os meus amigos, sócios, que ficam em casa, podem salvar o Sporting. Todos aqueles que deixaram de ir a Alvalade pelas razões que sabemos, podem salvar o Sporting. Há certas alturas na vida, que é preciso dizer bem alto: o povo é quem mais ordena. Aquele povo de que Marco Aurélio falou, pode salvar o Sporting, precisamente para evitar a morte de Alvalade e acabar com o
estigma.