Na sequência do post
Estará o "modelo Jesus" a acabar com o "modelo Sporting"? prometi que falaria aqui de forma pormenorizada sobre as aquisições e dispensas efectuadas pelo clube tendo como perspectiva o respectivo impacto numa organização que tem na sua formação um modelo que lhe tem proporcionado reconhecimento e prestigio.
O
casamento de Jorge Jesus com o Sporting é uma ligação perfeita, como são todos os
matrimónios de conveniência:
Que outro clube que não o Sporting
seria o ideal para Jesus retaliar contra a afronta praticada pelo seu anterior
clube?
Ao Sporting que melhor treinador poderia contratar, como atalho
para o fim de muitos anos sem títulos e para assegurar a pacificação das
hostes perante o final abrupto e atribulado de uma relação com um
técnico que acabava de lhe oferecer o final de um longo período sem
ganhar e com o qual se havia proposto a quatro anos de coabitação?
Ora,
como é fácil de perceber pelo discurso adoptado desde a sua chegada,
Jorge Jesus está de passagem pelo Sporting. Não no sentido filosófico da afirmação, mas até que surja um projecto
mais adequado às suas ambições. E todos sabemos que o projecto de Jorge
Jesus é ele e quem circunstancialmente lhe assegurar as melhores
condições para poder vencer.
O ideal para ambos - até pela idade de Jesus - era que
Sporting crescesse com Jorge Jesus - é certo que já
cresceu - para lhe poder satisfazer as ambições e ele passe a olhar para o clube não como um
apeadeiro para ajuste de contas passadas, mas como uma estação de destino para o seu e nosso próprio sucesso. Como não sabemos se isso algum dia sucederá terá que ser o presidente a perceber onde os interesses do treinador e do clube são comuns e quais são aqueles em que conflituam.
Já depois da publicação do post acima referido Bruno de Carvalho daria uma entrevista à SIC, na qual proferiu a frase de que me servi para titular o presente artigo, por me parecer o enquadramento adequado para este tema. Como aqui várias vezes defendi, a contratação de Jorge Jesus foi até agora a melhor medida de gestão desportiva tomada pela actual direcção.
Afirmar isto não significa que a sua passagem pelo nosso clube não requeira cuidados apesar de, neste momento da vida do clube, o treinador ser o técnico certo na cadeira certa. Porque o que é imediatamente bom para o treinador não quer dizer que o seja para clube e tudo o que pede seja necessário para atingir os objectivos. Cabe ao clube garantir a saudável coabitação entre a formação de jogadores e o mercado, por ser essa a forma mais adequada de garantir a sustentabilidade. Por isso é que Jorge Jesus não é para qualquer presidente.
Na lista de jogadores adquiridos e dispensados para rodar há exemplos claros de boas decisões, decisões que suscitam dúvidas e outras que parecem declaradamente más. Uma das características bem vincadas em Jorge Jesus é a preferência que demonstra por alguns jogadores em detrimento de outros, sem que muitas vezes se perceba outro critério que não o facto de serem indicados por ele. Vimos algo semelhante a isto o ano passado com o circunspecto Montero e o folião Teo, nunca saberemos o respectivo custo. Vejamos alguns dos exemplos que me parecem mais óbvios:
Boas decisões:
Podence, Tobias Figueiredo, Ryan Gauld, Domingos Duarte, André Geraldes e Francisco Geraldes - Apesar dos elogios deixados e da promessa de fazer parte do actual plantel, a dispensa de Podence, talvez a mais surpreendente por causa disso, acaba por se justificar, pelo que representou o final do mercado para o plantel do Sporting. Tal como para os restantes, o empréstimo proporcionar-lhes-á espaço para jogar com regularidade em projectos com alguma qualidade, o que pareceria ir acontecer com raridade, face ao que existia e passou a existir no plantel para os respectivos lugares.
Decisões duvidosas
A dispensa de Carlos Mané seria consensual se o seu clube actual não ficasse com o direito de opção. É um jogador em nítida perda, face ao que representou o seu aparecimento com Leonardo Jardim, mas essa estagnação é normal em jogadores da sua idade, pelo que a opção de compra parece um risco. Na mesma linha ponho as dispensas de Chaby e Ponde, mesmo considerando que se justificam. Especialmente o primeiro, por me parecer que a colocação de um jogador com as suas características e qualidade mereciam um projecto mais ambicioso.
Fica por perceber porque Wallyson não só não teve oportunidades como nem sequer é mencionado no discurso de Jorge Jesus. Com a chegada de Elias (31 anos), e de Meli (24 anos), que se juntam a Adrien o Sporting tem agora três jogadores para o mesmo lugar. Não haveria lugar aqui para Wallyson?
Petrovic (27 anos) é um jogador que, segundo o treinador, ainda nos vai surpreender. Mas, a menos que surja alguma lesão prolongada com William, ou os árbitros continuem a olhar para ele e a ver o Maxi (4jogos, quatro cartões para William...) não vejo como tal possa vir a suceder. Mas, ainda que o sérvio venha a ter oportunidades, não veremos muito mais do que um médio defensivo muito posicional, sem rasgo para por a equipa na frente, como faz William. Não deveria ser dada oportunidade a Palhinha (ou até mesmo a Wallyson, que também faz o lugar), em nome do futuro, ao invés de investir num jogador que pouco ou nada acrescenta e que ainda por cima podia ter vindo livre há um ano? E convém lembrar que já o ano passado fomos buscar para esta posição Bruno Paulista, cuja utilidade, necessidade bem como o preço ainda estamos para saber.
Más decisões:
Por Iuri a rodar porque dificilmente iria jogar é uma boa decisão. Mas se Jesus pensa que Iuri Medeiros precisa de "perceber que só talento não chega, tem de crescer com aquilo que é a exigência e a pressão" não deveria ter cuidado de providenciar um projecto mais próximo da tal exigência e pressão que vai encontrar no Sporting? Ora se Iuri cumpriu com distinção o estágio anterior, não seria melhor proporcionar-lhe agora uma experiência que significasse um upgrade, ao invés do que parece mais assemelhar-se a um desterro numa das mais fracas equipas da Liga, a par da chamada de atenção pública?
Ainda no âmbito das aquisições, o Sporting acabaria por aceder a um pedido de Jorge Jesus que mais se aproxima da satisfação de um capricho. Refiro-me a Douglas, contratado ao Trabzonspor. Não está obviamente em causa o valor do jogador mas, com a actual dupla de centrais consolidada, seria quase criminoso alterá-la e quase suicidário. E, ao contrário do que muito se vem dizendo, o candidato à saída não seria Semedo mas sim Coates.
Com a linha defensiva subida, como é comum o Sporting jogar grande parte dos jogos do campeonato, ter dois centrais pesos-pesados significaria confiar em excesso no excelente sentido posicional que ambos indiscutivelmente têm, mas ficar sem "plano B" sempre que aquele falhasse. É isso que a rapidez de reacção de Semedo oferece, o que até pode já ter valido pontos este campeonato. Esta complementaridade do jovem jogador poderia estar assegurada também por Naldo (ainda assim um excelente negócio) e a maior experiência e sentido posicional por Ewerton.
As primeiras contas vão-se fazer já daqui a três meses, quando ficar definida qual será a porta de saída para a Europa. Qualquer que ela seja - só não é admissível pensar a eliminação total de todas as competições - trará decisões muito difíceis de tomar. A continuidade na Liga dos Campeões é a mais desejada mas pode significar apenas mais dois jogos, podendo por isso ser ponderado se faz sentido manter um plantel tão caro como dilatado, onde por isso muitos não podem jogar. A Liga Europa não dá muito dinheiro, mas este plantel permitiria sonhar alto e longe. Nessa altura muitas das coisas que agora aqui se afirma ganharão outra luz e muitas delas farão todo o sentido.