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Foto "ABola" |
Desde que abandonei ontem o estádio nacional fiz os possíveis para evitar o mais ténue indicio que me obrigasse a reviver qualquer dos momentos que seguiu ao tempo em que abandonei a zona do Parque 3. Até aí valeu o memorável convívio entre Sportinguistas, que estava longe de anunciar o que se seguiria.
A entrada no estádio foi caótica e poderia ter sido trágica e o jogo acabou por quase me ter parecido patético em face das expectativas que tinha construído. A decepção foi grande e ainda mais dolorosa quando, há medida que o jogo decorria, se percebia que a equipa não seria capaz de dar a volta ao golo madrugador que tinha deixado a Académica como um estudante na Queima das Fitas, isto é, no seu território mais confortável.
O esforço feito para não me "cruzar" outra vez com o jogo da Taça foi infrutífero pois é quase impossível, nos dias que correm, não tropeçar nas noticias do dia e essa foi incontornavelmente a festa da cidade de Coimbra. Festa essa inteiramente merecida pelo que a sua equipa jogou e acreditou, em nítido contraponto com a do Sporting, que não só tinha mais obrigação como mais argumentos que, por várias razões, não soube utilizar em seu favor.
O meu azedume pelo sucedido ontem não é por isso por falta de fair-play, mesmo considerando que a Académica não leu esse compêndio, a avaliar pelo anti-jogo que praticou nos noventa minutos. Convém porém lembrar que nós fizemos o mesmo com o Man City quando nos deu jeito e até onde de nos deixaram ir. E o azedume já nem sequer tem origem na arbitragem colaborante com o anti-jogo a que juntou uma sábia gestão do apito no sentido de, sempre que possível, deixar os academistas respirar, interrompendo o jogo, ou nos diferentes critérios disciplinares. No fim do deve e haver o que conta é que o Sporting perdeu uma final que não podia perder e isso deve-o sobretudo a si mesmo.
Nestas alturas é muito comum as reflexões sobre o Sporting, o que até é natural, não fora o facto de serem quase sempre os mesmos (José Eduardo foi o primeiro) a porem-se em bicos de pés ou a querem sangue. No imediato a sorte do Sporting muda, mas muda pouco. Mas o mesmo aconteceria caso tivéssemos ganho e manda por isso o bom-senso não comentar "dando de beber à dor".
Mas há perdas menos imediatas, das quais daremos conta mais adiante, e que estão além deste soco bem na boca do estômago do nosso ego. Desde logo o não apuramento directo para a Liga Europa, com a obrigação subsequente de, pelo terceiro ano consecutivo, termos que começar mais cedo, quando ainda falta compreender as consequências que tal facto tem na relação com os demais concorrentes da Liga, em particular os rivais mais directos. E essas perdas estendem-se à ausência da Supertaça, competição que pode muitas vezes ser a pedra de toque anímica no lançamento de uma época. Estou-me a lembrar do começo de época de Villas Boas no FCP, por exemplo.
Falei do óbvio, ficando no entanto no ar algo que, não sendo tangível, não é por isso menos decisivo no presente do Sporting. Falo do presente do Sporting que começou ontem da forma que sabemos e o que podemos esperar da próxima época. Que forças têm os adeptos para mais uma vez se levantarem e fazerem ao caminho? E que danos tem uma época sem títulos e com desaires traumáticos (Bilbau/Taça) num grupo que, por ser recém-formado, gozava da virtude de não estar ligado aos desaires dos anos anteriores, e que tanto marcou (e ainda marca...) a relação dos adeptos com alguns jogadores?
Posta já alguma distância sobre o jogo, julgo que ele acaba por retratar bem os problemas do Sporting no que ao seu futebol diz respeito, e que tem a ver com o seu modelo de jogo. Foi assim no tempo de Domingos e acabou por terminar assim já com Sá Pinto e, juntamente com outras questões que agora não soariam a mais do que desculpas, são responsáveis pela época realizada. Mais, sem eles resolvidos, podemos esperar pouco mais da época que aí vem.
Falo em concreto na dificuldade em ultrapassar equipas que se sabem fechar bem atrás, isto é, a maioria das equipas nacionais que em regra, o fazem muito melhor do que a maioria das que nos cruzamos nos compromissos internacionais. Como disse aqui em
post anterior, a produção atacante do Sporting é muito inferior às equipas que disputaram este ano o campeonato, embora o que diz respeito à segurança defensiva ela já se enquadre nesses valores.
É nessa perspectiva que o jogo da Taça não poderia ser melhor exemplo. Tivemos mais de 90 minutos para sequer empatar o jogo e não só não conseguimos criar oportunidades em qualidade e quantidade, como passamos a maior parte do tempo a jogar aquilo que eu chamo de "jogo limpa para-brisas": a bola circula de um lado para outro mas raramente penetra onde faz doer: pelo centro. E a maior parte das jogadas pelas laterais criam perigo até ao último passe, acabando este quase sempre nos pés dos defesas contrários, por falta de rigor de quem o faz e também por falta de presença na área.
A discussão sobre o Sporting ganhará relevo nos próximos dias, é quase fácil de adivinhar. Mas, por mais considerações que se façam sobre as finanças, o presidente, a direcção, os investidores, etc. etc. sem resolver este problema o Sporting continuará apenas a oferecer desilusões. Repare-se no caso do nosso rival: o presidente é o mesmo, que coleccionou asneiras atrás de asneiras, que o fizeram gastar fortunas atrás de fortunas, para ficar quase invariavelmente atrás de nós e até de outros, até ter encontrado o seu Messias: Jorge Jesus. Este, apesar de já levar o segundo ano desaires, mais pela sua soberba do que por falta de saber, vale muito mais do que LFV e demais entourage.
É dentro desse raciocínio que as atenções se concentram no trabalho de Sá Pinto para a próxima época. A fase em que pegou na equipa não lhe deu tempo suficiente para, através do treino, alterar rotinas viciosas, tendo agora uma parte fundamental da época - a chamada pré-epoca - para lançar as bases do seu trabalho e as suas ideias. Por estas e pela forma como decidirá construir o próximo plantel teremos os primeiro indícios até chegarmos ao pontapé de saída.
Sá Pinto está de luto, fazendo fé nas suas palavras e na sua condição de Sportinguista e com ele estamos, por isso, todos nós. Quem fez o diagnóstico que ele fez (Estava à espera de uma equipa que fosse agressiva quando não tivesse a bola, dominadora
quando a tivesse (...) Devíamos ter tido mais paciência, devíamos
ter sido mais agressivos sem bola e ter outra postura com bola) está mais perto de descobrir o caminho. Cabe também a todos nós saber fazê-lo de forma adequada, sabendo fazer aquilo que se espera sempre de um Sportinguista: colocar acima dos seus interesses, e neste momento particular de dor, os interesses do Sporting. Eu faço o meu desde ontem.
Nota Importante:
Provavelmente poucos se aperceberam mas esteve ontem iminente uma tragédia nos momentos que antecederam o jogo. Fruto da má organização do jogo, de responsabilidade da FPF, a hora que antecedeu o jogo acumulou milhares de pessoas na única entrada de acesso destinada à maioria dos adeptos que era a superior. Se o pior tivesse sucedido não faltaria agora quem imputasse responsabilidades às condições deficientes do recinto. Mas se todos os estádios deste país adoptasse os mesmo critério, velhos ou novos, todos teriam os mesmos problemas.
Quem estava do lado onde me encontrava pode presenciar momentos de pânico, envolvendo mulheres e crianças, que só não resultou em algo que estaria agora muita gente a lamentar, por mero acaso e algum bom senso, pese o pânico dos envolvidos. Bom senso de que estiveram arredadas as autoridades, que a tudo assistiam de forma complacente. Com tudo isso o que resultou de mais visível foi que milhares de adeptos perderam quase toda a 1ª parte, mas podia ser pior.
Por isso não deixei de sentir como uma provocação o já habitual aparato policial quando no final do jogo os mastins (não me refiro aos pobres animais de 4 patas...) da policia de intervenção se alinharam na frente da curva onde estavam os adeptos Sportinguistas, num ritual de caserna absolutamente ridículo.