Quem leu o meu artigo, ontem, onde fazia o lançamento do jogo e teve a sorte de o ver acabará por descobrir uma das razões pelas quais eu nunca acertei no euromilhões. De facto falhei na minha previsão de inclusão do Onyewu – supus que Carriço voltasse ao banco – acontecendo o mesmo relativamente a Matias, mas ao contrário, porque o chileno acabou por jogar de inicio. Mas o que o futebol tem de aleatório e até caótico no relvado, tornando-o imprevisível, não o deveria ser no momento de montar a equipa e o jogo de ontem até aos 58m acabou por me conceder alguma razão, embora não explique a exibição descolorida até então.
O problema Matias
Sempre me pareceu tempo perdido recorrer a adaptações que não resultem de força maior. Foi o caso ontem do chileno. No final do jogo fiquei com a impressão que perdeu ele, porque joga limitado, sem poder expressar o seu futebol em plenitude, e perdeu a equipa ao ter uma unidade constrangida. Assim, ao invés de termos El Crá, teremos em Matias um problema, o que é uma pena.
O Sporting tem para aquela posição 3 jogadores que asseguram qualidade e que nos põe a salvo de lesões e oscilações de forma. Carrillo, Pereirinha e Jeffren. Neste momento, por esta ordem, mas que pode ser revertida ou invertida. Sobre Carrillo falarei mais adiante. Jeffren, antes de começar a época, tinha-o na lista das 3 melhores aquisições do Sporting, a par de Capel e Schaars, e não vejo razões para o retirar de lá, para já, o balanço far-se-á no final da época.
O(s) problema(s) Rinaudo
O argentino tem 3 questões para resolver, nem todas dependentes dele, e que o transformam numa das fragilidades da equipa. Começo pela questão disciplinar. Já deu para perceber os Capelas deste mundo o têm debaixo de olho, como se viu pelo amarelo ridículo de ontem.
Mas se Rinaudo pouco poderá fazer face aos homens de negro, sem abdicar do estilo que lhe é próprio mas que não é desleal para os adversários, pode melhorar e muito no capitulo técnico, sobretudo no que diz respeito à qualidade do passe. Talvez isso passasse mais despercebido numa equipa pequena como a do Gimnásia de La Plata, que passava grande parte do tempo a tentar recuperar a bola. Mas numa equipa grande como a do Sporting, em que a tarefa de construir é tão importante, essa fragilidade fica demasiado exposta, em particular quando os jogos teimam em não correr bem, como foi o caso de ontem. E se os problemas se vão resolvendo naturalmente com adversários menos exigentes como o de ontem, com oponentes mais fortes dificilmente ficaremos a salvo de amarguras. Um problema que ele poderá solucionar com tempo até porque é um bom jogador, indiscutivelmente.
E aí já estamos a falar do terceiro problema, que é a falta de alternativa especifica no plantel, embora haja “quem faça o lugar”, o que não é a mesma coisa, como vimos no caso do Matias. Seria uma prioridade para mim na reabertura do mercado, procurando um elemento de características semelhantes às de Fernando ou Xavi Garcia dos rivais, melhorando com isso o apoio à defesa no jogo aéreo.
O que é o cansaço e o ritmo de jogo?
A dada altura do jogo, face à participação abaixo do esperado de Elias, Rinaudo e Ínsua, perguntava-me se o problema não podia ser o cansaço – os jogadores fartaram-se de viajar mas pouco jogaram nas últimas 3 semanas – se podiam então ser a falta de ritmo. Uma questão interessante a que não consigo responder, até porque me escapam dados essenciais para uma avaliação correcta, e que estão apenas ao alcance de quem acompanha o plantel de perto. Mas, no final do jogo, não evitei concluir que os 3 estiveram uns bons furos abaixo do que estavam antes da paragem do campeonato e que não me pareceu apenas resultantes das circunstâncias do próprio jogo.
Perda de tempo?
Domingos preferiu, a dada altura do jogo, meter toda a tracção à frente, talvez para conceder um justo prémio a Rúbio e Bojinov pela aplicação paciente e também para permitir a consagração de Capel, ontem o melhor nos piores momento. Prescindiu assim de treinar em competição alternativas ao 4x3x3, perdendo assim uma oportunidade de fazer crescer a equipa, pelo menos assim o interpretei a dada altura. E Domingos, ao reconhecer que ainda podemos ser mais fortes reconhece margem de crescimento e necessidade de trabalho, que a vitória não ofusca, o que é um bom sinal que vem do treinador.
Mas o futebol não se esgota no treino e na táctica e o Sporting de hoje é um bom exemplo disso. A importância de factores abstractos e aleatórios como a confiança colectiva não podem nem devem ser desprezados e os nossos adversários terão isso em conta, mais ainda depois de ontem. Nesse sentido o jogo de ontem foi precioso. Quantas vezes, no passado recente, com o crescer do adversário, como aconteceu ontem a partir dos 30m de jogo, a nossa equipa deslizava e soçobrava?
Sporting recorre ao melhor doping
Uma equipa crente nas suas possibilidades é uma equipa temível porque recorre ao melhor dos doping´s que ainda por cima é legal: a confiança. Nesse estado não há fatalismos, nem dificuldades que atemorizem. A imagem perfeita desse estado é mais óbvia em Capel, que agora até marca de cabeça e a dobrar.
Mas é Carrillo é o melhor espelho dessa realidade, mas cuja força não parece esgotar-se apenas no momento colectivo da equipa. Ela parece advir de algo que lhe é inato e é evidente quando parte directo ao adversário e, onde muitos vêm uma parede ele parece ver uma mera referência no caminho da baliza. Tem a autoconfiança dos grandes craques, tem técnica e velocidade e pode tornar-se num caso sério mas ainda não o é. Está entre o que pode vir a ser - um craque – e o que hoje é – uma promessa – o que devemos exigir dele no imediato.
O Sporting acabou por ganhar de forma retumbante, mas nem sempre foi retumbante, há que reconhecê-lo. Sendo uma vitória de justiça incontestável, é também anormal, dentro da anormalidade que é verem-se 6 golos em cerca de 30 minutos. Mas é um importante subsídio para as maiores dificuldades que se avizinham, fazendo do Sporting uma equipa com que se tem de contar e do clube um nome incontornável nas primeiras dos jornais.