A noticia do jornal "O Jogo" aludida no titulo do post provocou grande indignação entre os Sportinguistas. Na base dessa reacção estará o tratamento diferenciado que aquela publicação dá aos três clubes grandes, ao fazer apenas capa com os aparentes insucessos de algumas das nossas contratações, deixando de fora as do SLB e FCP.
Compreendo e partilho do sentimento, talvez não com o mesmo grau, porque a este nível já há pouco que me surpreenda. Na verdade não há aqui nada de muito novo neste comportamento num órgão de comunicação social relativamente ao meu clube e no caso daquele jornal é mesmo uma imagem de marca. É sobejamente conhecida a ligação umbilical ao FCP e o seu principal accionista é-o também da SAD daquele clube, onde a sua participação é crucial para manter o respectivo controlo.
Na sequência da referida noticia ficou mais ou menos claro que a nossa concorrência possui listas de emprestados mais numerosas e muito mais dispendiosas que aquelas que foram noticiadas como pretensos falhanços nossos, o que terá contribuído para aumentar a indignação geral. Porém, das listas que vi elencadas há uma semelhança notória e uma diferença gritante.
A semelhança:
As diferenças no número de jogadores dispensados e o volume financeiro associado são os mesmas que encontramos nos orçamentos das SAD's dos respectivos clubes. Grosso modo, os onze milhões em dispensados do Sporting equivale a metade do orçamento da SAD. O mesmo se poderá dizer, respectivamente, dos mais 50 milhões em emprestados da SAD encarnada e dos mais de 60 milhões da SAD azul-e-branca.
Esse mesmo rácio pode-se verificar nos valores dos:
- Custos operacionais (52,105 milhões / 106,474 milhões / 110,335 milhões)
- Proveitos operacionais (53,382 milhões / 101,974 milhões / 93,588 milhões)
- Mais-valias com transferências de jogadores (28,002 milhões / 78,825 milhões / 82,500 milhões)
Estes são números retirados dos últimos relatórios e contas comunicados pelas respectivas SAD's à C.M.V.M.
A diferença
Aparentemente, (e considerando como totalmente irrecuperáveis os valores investidos na aquisição de todos os emprestados) o desperdício e insucesso estão ligados ao limite do que nos é possível gastar o que, no que ao grau de eficiência de gestão diz respeito, remete-nos para uma equivalência entre todos. A favor da actual gestão da nossa SAD está o facto de, com muito menos dinheiro, estar a conseguir aquilo que o FCP não tem conseguido (não ganhou nada mas gasta muito mais).
Há contudo uma diferença gritante entre as listas de jogadores dos nossos rivais postas a circular e a que o jornal "O Jogo" deu ontem a conhecer: é que da nossa contam apenas jogadores adquiridos desde 2013. Nas dos nossos rivais há diversos jogadores, alguns deles de valores consideráveis a engrossar o resultado final, que foram adquiridos antes de 2013 (por exemplo, Sidnei, Olá John / Walter, Kelvin, Quiñones).
O parágrafo anterior é composto por dados factuais. Mas a análise, mesmo que subjectiva, relativamente à qualidade dos jogadores constantes nas três listas indica que:
- Dos jogadores por nós dispensados, talvez apenas Jonhatan possa vir a constar de um plantel que lute pelo titulo. Para os restantes, a dúvida é mesmo se conseguiremos ser restituídos do valor neles investido.
- Neste âmbito seria ainda forçoso adicionar à lista de dispensados contratados
em 2013 os nomes de Ryan Gauld, Sarr, Rabia e Sacko como de qualidade
ou recuperação muito duvidosas.
- Na lista portista jogadores como Reyes, Quintero, Adrian Lopes, Fabiano, Josué e Octávio discutiriam lugares no onze titular no imediato uns e no futuro outros.
- Na lista de dispensados benfiquistas Rúben Amorim, Cristante, Djuricic e Ola John teriam estatuto semelhante.
Ora, para lá da indignação pela diferença de tratamento, que é natural, o que a noticia de "O Jogo" nos devia suscitar era o despertar para uma maior atenção sobre nós mesmos, sobre o que andamos a fazer. Porque é o que fazemos - e muito menos o que os outros fazem - que dita o nosso destino. No entanto cada vez mais a atenção geral parece estar a ser desviada para o que os nossos concorrentes fazem de errado, ignorando o valor indispensável da autocrítica no aprimoramento das competências próprias.
Já não é possível anular estas decisões mas é possível ou até mesmo obrigatório fazer a pergunta:
- Se o dinheiro tivesse sido gasto de forma mais assertiva e criteriosa o ano passado não teríamos tido maior disponibilidade para dar melhores condições a Jesus para atacar o título?
- Apesar do evidente crescimento sustentado dos resultados, é este o modelo de gestão que nos foi prometido, nomeadamente no que diz respeito à formação e ao rigor na gestão?
Mesmo que de uma forma superficial podemos alargar este raciocínio e fazer um relance sobre o que se tem passado nos escalões inferiores, habitualmente designados como de formação. Para tal recuei ao mesmo período, em 2013. A nossa equipa B dava os primeiros passos e, à época, disputou uma competição até à meia-final da qual alguns ainda se lembram.
Nela constavam jogadores como Esgaio, Riquicho, Tobias, Ruben Semedo, Geraldes, Domingos Duarte, Palhinha, João Mário, Mané, Iuri Medeiros, Wallyson, Farley Rosa, Ponde, Podence, Gélson Martins e Chaby. Em três anos a qualidade disponível neste escalão desceu de forma exponencial e algum do pouco talento disponível vive soterrado num modelo de jogo que não apenas o anula como impede a generalidade de evoluir.
No entanto o treinador foi premiado o ano passado devido a um critério no mínimo aberrante num escalão de formação: ter ficado à frente dos rivais! Quem, do actual plantel, poderá seguir as pisadas dos nomes que figuram no topo deste parágrafo?
Ora, se voltarmos ao motivo deste post (a famigerada lista de emprestados) o que verificamos é que nela não constam os jogadores que mais depressa poderão ascender ao plantel principal: Iuri Medeiros, Palhinha e Wallyson. Todos eles partilhando a mesma condição: serem oriundos da Academia. E quando acabar esta geração, quem se poderá seguir?
Para muitos estas questões não farão qualquer sentido. Porém parece-me ser urgente fazê-las porque está em causa a sustentabilidade do nosso modelo e talvez mesmo uma parte muito grande da nossa identidade como clube.
É neste âmbito que posso entender uma aposta total no "titulo o mais depressa possível" que parece ser o mote deste ano. Porque um clube grande alimenta-se de títulos. Mas a luta é a três e por isso, no máximo, temos 33% de hipóteses de ganhar à partida. É preciso estar preparado (preparado=equilibrado) para o caso dos outros 66% de possibilidades ocorrerem.