Grande parte da entrevista é dedicada ao caso Bruma e à relação com os agentes de jogadores, daí que grande parte dos comentários que aqui deixo sigam o mesmo diapasão.
Quanto ao contrato e a posição do Sporting
Da forma como é explicado parecem não substituir dúvidas relativamente à ligação do jogador ao clube. Ligação que o jogador e representantes foram sempre reconhecendo até que lhes passou a dar jeito não o fazer. No entanto as dúvidas estão na sombra das declarações de BdC, especialmente quando afirma que a derrota do Sporting neste processo equivale a uma derrota da justiça e do futebol.
Mas quantas derrotas de igual teor não coleccionamos já ao longo das últimas décadas? Por isso no meu último post sobre esta matéria dizia que, especialmente neste caso, ao deixar fugir este assunto do seu controlo e permitir a intervenção de terceiros – a CAP – a posição do Sporting perdeu força. Não força legal ou moral, mas por ficar à mercê dos interesses obscuros que campeiam no futebol. Paradoxalmente os mesmos interesses que BdC diz na entrevista querer combater neste e noutros processos em curso.
A prova que o Sporting luta com armas desiguais, para lá das que estão documentadas nesta entrevista, é que ao longo deste processo foram várias as ocasiões em que “escorreram” para a comunicação social pareceres e circunstâncias processuais quase sempre desfavoráveis co clube. Culminaram nesta semana com a divulgação do testemunho de Pedro da Cunha Ferreira como pretensamente desfavorável ao clube, o que é, como o próprio muito bem afirmou, uma peça de escrita criativa notável. Pior do que isso é ser dado conhecimento público do que devia ser sigiloso, isto sem falar no papel a que o jornalismo se sujeitou neste caso, e que não pode ser ignorado. Mais ridículo ainda foi a ideia transmitida por um dito especialista de que o Sporting, em caso de decisão desfavorável, perderia até os direitos de formação, o que me parece absurdo face ao que está em disputa neste caso, que é apenas o vínculo e não vencimentos em falta.
A renovação acordada há muito, a estratégia de dilação, os erros de Godinho e os próprios
Tal como era então do conhecimento público havia um princípio de acordo entre a anterior direcção e Bruma e que agora BdC confirma. Não se percebe porque o acordo não foi levado a efeito, tendo em conta a importância do jogador. Mas não é líquido afirmar que, caso a renovação tivesse sido concretizada, Bruma não estaria na mesma em conflito com o clube, caso BdC entendesse, há semelhança de outros processos ainda a decorrer, que o jogador havia renovado por valores exorbitantes. Por outro lado parece-me óbvio que se a estratégia dos representantes de Bruma era meramente dilatória, sem interesse em renovar, o mesmo argumento deve ser usado para qualificar as relações com direcção anterior e que, inevitavelmente, nunca houve qualquer interesse em renovar com o clube, fosse quem fosse que o representasse.
As guerras pela moralização
Ninguém duvida, creio, da necessidade de moralização do papel dos agentes e dos fundos de jogadores. A minha dúvida, expressa aqui desde a primeira hora, é que seja o Sporting a fazê-la sozinho. O relato do que se passou com Ié é apenas um dos muitos casos que chegam ao público.
No caso concreto de Bruma, se ao jogador é indiferente que parte do que lhe cabia vá para os seus representantes, porque me haveria eu de importar?
Se processos idênticos e especialmente com os melhores jogadores, tiverem invariavelmente o mesmo desfecho, os interesses do clube estão a ser devidamente protegidos?
Sendo a transferência de jogadores uma parte vital para sustentabilidade da SAD, e não podendo o clube escolher pelos jogadores quem os represente, a repetição deste tipo de problemas colocará o Sporting à margem e por isso em dificuldades.
É impossível não concordar com BdC quando este diz que (página 5)
“é essencial definir regras claras para os agentes de futebol e que permitam a defesa do futebol dos clubes e jogadores. Isto deve ser uma prioridade dos governos e das instituições que supervisionam o futebol mundial (…) O mesmo no que diz respeito aos fundos(…).
A pergunta que fica é o que fará o Sporting enquanto tal não acontecer, se é que alguma vez acontecerá?... Porque o caso Bruma é já quase passado, interessa agora o que o futuro vai trazer.
Independentemente do resultado deste processo, se dele se retirarem as devidas ilações, alguma coisa de bom se poderá extrair em prol do clube, para que ele não tenha representado apenas perda de tempo, de energia e de valor para todos nós.
Uma nota sobre quem ganhará ou quem perderá com o resultado final: Para já perde o jogador e o clube. Bruma por estar privado de fazer o que mais gosta e o que melhor sabe, que é jogar. O clube porque perde um jogador que seria importante na sua estratégia e não tem substituto à altura. No final perderá ou ganhará o Sporting e não apenas uma qualquer fracção. É tempo de deixar de lado os discursos divisionistas do "eles" e do "nós" porque uma parte do clube é sempre mais pequena que o seu todo.
Pessoalmente confesso o meu cansaço com o tema e até já dei baixa do Bruma no meu deve e haver, isto porque já nem acredito que a uma decisão favorável corresponda a rápida solução do caso. As recentes declarações do advogado do jogador são mais uma escalada para uma não solução. Fica a entrevista para as brumas da memória.
Uma pequena nota mais para quem apoia o presidente na mediação com a imprensa. Acho insultuoso para ele e para o clube que erros lexicais, involuntários ou não, sejam colocados em itálico na entrevista. Tal significa que foram notados mas propositadamente não corrigidos, o que, ao longo de muitas décadas de leitura do jornal em causa, é totalmente "inovador".