Animais de rua
Animais de Rua é o nome de uma associação que recolhe, trata e esteriliza animais errantes, nascidos na rua ou abandonados por nós e com que nos cruzamos vezes sem conta no nosso dia a dia. Animais esses que se distinguem de nós pela ausência de racionalidade, mas que por vezes nos dão lições de apego, afeição e por vezes até de empatia.
Muitas vezes usamos a palavra "animal" para qualificar aqueles que entre nós se comportam de forma cruel e com total ausência de simpatia, compaixão pelos sofrimento dos outros. Comparamos-os com os animais selvagens, esquecendo que o comportamento destes é essencialmente instintivo, de sobrevivência, e sem intenção de fazer o mal "porque sim". Ao contrário de nós humanos, que possuímos, ou devíamos possuir, ferramentas que nos permitem fazer a distinção entre o mal e o bem.
Vem isto a propósito de mais uma actuação selvática do corpo policial mobilizado para gerir a segurança dos festejos da titulo nacional no passado sábado. A perda de visão de um dos olhos de um dos nossos adeptos é "apenas" a face mais visível de uma batalha campal promovida pelas forças que deveriam ser de segurança e mais não fizeram do que promover a violência. Várias dezenas de adeptos foram surpreendidos por disparos de balas de borracha visando qualquer parte do corpo, nomeadamente as zonas superiores, rosto incluído, com várias pessoas a terem que receber tratamento hospitalar. Terá sido provavelmente um milagre que não se tenha registado um evento grave envolvendo uma das muitas crianças que, acompanhadas pelos familiares, festejavam sem se aperceberem, uns e outros, do perigo que corriam.
Perante estes eventos a PSP, de forma extemporânea, já havia concluído que os "festejos decorreram de forma globalmente tranquila, positiva e serena". É caso para perguntar como seria se tivessem corrido mal... No entanto esta postura não surpreende. São já muitos os anos de actuação violenta sobre os adeptos, a quem na generalidade consideram todos criminosos até prova do contrário. Essa postura é ainda mais vincada nas chamadas forças especiais que, ao invés de uma actuação preventiva e apaziguadora, preferem quase sempre exibições de força desproporcionada, sob qualquer pretexto, sem uma razão que verdadeiramente a justifique. Aliás, o próprio aparato bélico que fazem gáudio exibir à volta dos estádios transporta-nos para as rusgas nos guetos e favelas que se fazem por esse mundo fora.
Não pretendo com o que aqui digo que não possam ter havido situações a requer maior cuidado, como a que se registou no Saldanha, tal foi o volume de fogo de artificio ali lançado. Até porque, infelizmente, nem todos sabem manejar convenientemente os artefactos pirotécnicos, o que exponencia ainda mais o perigo inerente ao seu uso.
Como é óbvio e habitual nestas circunstâncias a cúpula da PSP procura agora álibis para o injustificável. E isso não é apenas o que resultou na cegueira do nosso adepto, mas sim no comportamento agressivo fútil dos "robocops". Há um enorme rol de testemunhos de agressões gratuitas quase desde a saída do cortejo de Alvalade até ao Marquês. Comportamento esse que já se anunciava com a insensata proibição de abertura de grande parte da restauração à volta de Alvalade.
Ao fazê-lo, a PSP não teve em vista a segurança ou o bem estar daqueles a quem devia proteger, -os adeptos - mas sim no seu próprio conforto, não levando sequer em conta o óbvio: os estabelecimentos fechados ao ínvés de dispersar os adeptos ia contribuir para o que é normalmente mais perigoso: ajuntamentos numerosos. Felizmente os Sportinguistas preocuparam-se mais em viver a festa e, aí sim, se justifica o louvor pela forma tranquila positiva e serena com que o fizeram.
Sabemos bem o que se seguirá: o tempo a escorrer, jogando com a imposição de novos acontecimentos pela agenda mediática, e a verdade e o apuramento de responsabilidades e jazerem sepultados sob o habitual código de silêncio corporativo, que nos remete para comportamentos mais próprios de organizações criminosas do que de uma força que deveria proteger os cidadãos.
Por razões diferentes, mas igualmente urgentes, é necessário que, à semelhança do que acontece com o exemplo dado acima, alguém retire da rua também estes animais.
Excelentes análise e reflexão. As melhores que li desde que os festejos foram ensombrados pela atuação da PSP. Atrever-me-ei a acrescentar uma interpretação. A precipitada congratulação da PSP terá sido já uma tentativa atabalhoada, mas nem por isso menos cobarde de branquear a conduta violenta das forças policiais e, muito particularmente, "dulcificar" publicamente a perda de um olho de um adepto do Sporting como sua consequência.
ResponderEliminarBravo! Que aqueles que devem garantir a segurança dos cidadãos se transformem numa ameaça a essa segurança é intolerável numa sociedade decente!
ResponderEliminarExcelente texto
ResponderEliminarSeria nestes momentos que se esperaria uma posição firme de quem lidera o clube e que deveriam representar estes adeptos. Deviam ser os primeiros a exigirem responsabilidades.
ResponderEliminarMas quando são os primeiros a alinhar nestas faltas de respeito pelos reais donos do clube, estes que pagam o apoio ao clube do seu próprio bolso, deslocações enormes, desrespeitados pelos horários dos jogos, agora agressões policiais fúteis... Mas dizia eu, quando é a própria direcção a desrespeitar os adeptos no próprio estádio, perdem legitimidade.
Já agora seria interessante saber a cor clubística do artista FDP que cegou uma pessoa que estava apenas ali a festejar.