Não há camas na pedreira onde jaz o estádio de Braga. Se as houvesse ainda hoje lá estaria, a contemplar em flashbacks permanentes o golo do Harder ( o terceiro) a entrar em camara lenta, seguidos da explosão de abraços e lágrimas na bancada. O abraço final no meio do relvado de toda uma EQUIPA com o seu criador / arquiteto, que agora se desfaz e que nos devolveu o Sporting que há muito ambicionávamos e merecíamos. Como se ficar ali, como guardião das memórias do melhor Sporting de sempre, que a nossa vista pôde alcançar, parasse o tempo, e Amorim assim permanecia, continuando nós campeões.
É este Sporting insubmisso, que grita de revolta no balneário, que não se conforma e faz nos seguintes quarenta e cinco minutos um jogo de muitas vidas: das nossas, das deles, convocando todos, como disse Amorim, enchendo o relvado, obrigando um adversário cansado a sentir que jogavam não apenas contra onze, mas contra a uma legião. NÓS, a nossa legião.
Mas Amorim já não está, mais uma conferência de imprensa magistral e inédita a brilhar no negrume geral de um futebol geralmente pequenino e tacanho serviu para confirmar o adeus. As saudades de Amorim também serão estas. A última dança de Amorim, tal como os episódios da temporada final da sua estadia, foi coreografada pelos deuses da fortuna num guião inigualável. Emoção, suspense, frustração, receio, para terminar num final épico e apoteótico.
As minhas primeiras palavras para João Pereira são de gratidão pela coragem de assumir uma equipa 100% vitoriosa na Liga e com uma participação brilhante na Champions. Ele sabe que, com a indispensável sorte, o melhor que conseguirá será igualar a performance derradeira do seu antecessor, pelo menos no que à Liga diz respeito. Teria ficado muito mais confortável no sossego da penumbra da equipa B, do que se ver obrigado a subir apressadamente as escadas, saltando degraus, até ao palco imenso que ser treinador do Sporting oferece.
Depois dar-lhe o direito, na minha infinita milionésima parte que me cabe como adepto anónimo, de ser ele próprio, ser o João Pereira treinador. Não já o jogador que conheci, o “ranhoso”, como lhe chamou carinhosamente Rúben Amorim, nem sequer o comparar com o amigo que agora lhe entrega o cargo. Estimo contudo que aproveite o seu legado de transparência e lucidez, tão elogiado na despedida pela generalidade da comunicação social, compreendendo na perfeição o quanto nós, Sportinguistas, gostamos de nos distinguir dos demais na forma como olhamos e somos actores no fenómeno desportivo.
A apresentação revelou um treinador confiante e um João Pereira emotivo. Precisamos dessa segurança profissional tanto como do sentimento, para que nos guie com segurança, mas também perceba os nossos anseios, como somos e como queremos ganhar. Continuar a ganhar!
Para finalizar peço aos deuses da fortuna que realizaram a passagem de Amorim, digna de cinema, que deixem ficar um pouco da estrelinha que o acompanhou, porque ela é importante e não há treino possível que substitua o papel que ela – a sorte – desempenha. Eu, minha milionésima insignificância de adepto anónimo estarei junto com os demais Sportinguistas que trazemos este clube no coração e fazemos dele um pouco – ou muito?... – das nossas vidas a ansiar que este novo “e se corre bem” corra mesmo muito bem. Compreendendo que não ganharemos sempre, mas querendo sempre ganhar mais.
Muito do sucesso da passagem de Amorim teve também em nós actores principais, especialmente quando as coisas não correram bem, e foram várias as ocasiões. Não nos calamos no apoio quando goleados pelo City em casa, ou não descremos no momento da improvável eliminação da Taça de Portugal pelo Varzim ou na derrota recente na Supertaça. Estaremos aqui também para ti, João, nessas alturas.
Parabens ao meu vizinho, pela bonita vitória contro o City.
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