Quando hoje se diz que o Sporting vive um dos piores períodos da sua história isso só pode ser o resultado da frustração ou do desconhecimento dessa mesma história. Quer antes quer depois do consulado de João Rocha o Sporting viveu momentos bem mais dramáticos. Foi num período assaz complicado que o Sporting viu surgir um dos seus melhores dirigentes de sempre.
João Rocha chegou ao Sporting num momento de profunda crise directiva, sem que ninguém quisesse assumir a presidência. O presidente Valadão Chagas havia sido eleito no dia 29 de Março de 1973 mas abandonaria o cargo no dia seguinte (!) à tomada de posse, 4 de Abril, em direcção ao governo de Marcelo Caetano, deixando na gestão interina o seu Vice-Presidente Manuel Nazareth. Este havia deixado bem claro que não tinha vontade nem ambição para o cargo. A crise estender-se-ia até Setembro desse ano, mais propriamente até dia 7, quando João Rocha chega à presidência do clube.
Quando tomou posse João Rocha, que era até um sócio relativamente recente, de imediato revelou a ambição que o trazia: "Julgo que se deu uma nova tomada de consciência, um certo empolgar da alma colectiva. Fascina-me a ideia de erguer uma grande obra, apoiada por milhares ou milhões de pessoas e que possa representar uma viragem nos nossos clubes desportivos". Palavras essas que seriam materializadas por inteiro nos 13 anos em que presidiu ao clube.
Foram nesses anos que o Sporting saiu da letargia em que se encontrava para dos pouco mais de 40 mil sócios chegar aos 130 mil. O período de João Rocha ficou assinalado por mais de 1200 títulos nacionais, 52 Taças de Portugal, 8 Taças dos Campeões Europeus de Corta-Mato, uma Taça dos Campeões Europeus, duas Taças das Taças, uma Taça CERS em Hóquei em Patins. O Sporting chegou a movimentar cerca de 15000 atletas em 22 modalidades! O nome do Sporting chegou a todo mundo quando Carlos Lopes ganhou a primeira medalha de ouro nuns Jogos Olímpicos. Entre 1981 e 1985 realizaram-se quatro(!) Congressos Leoninos, em Lisboa, no Rio de Janeiro, em Toronto e na Madeira e nos Açores! Pode-se dizer com propriedade que o Sporting viveu uma verdadeira refundação.
Uma marca da passagem de João Rocha pelo Sporting foi sempre a sua quase omnipresença junto das diversas equipas e atletas, fossem quais fossem as circunstâncias. Manuel Fernandes, o grande capitão, testemunhou-o, depois de lhe oferecer a sua camisola, quando em 1982 acabava de conquistar a dobradinha, vencendo a Taça de Portugal no Jamor: "O presidente merece. Tem-nos acompanhado nos bons e nos maus momentos,
Quando perdemos vai às cabines e moraliza-nos: Chega inclusive a
fazer-nos vento com a toalha...".
Foi no futebol que João Rocha conheceu mais dificuldades. Nos 13 anos de mandato ganhou apenas três Campeonatos Nacionais, três Taças de Portugal e uma Supertaça. A isso não será alheio o aparecimento de Pinto da Costa. Sustentado numa estratégia de quem percebeu que o futebol português suporta a muito custo a existência de mais de 2 grandes clubes, o ainda presidente do FCP elegeu como primeiro alvo o Sporting, contra quem foi travando as suas primeiras grandes batalhas. Ficou célebre a sua frase após mais uma acesa disputa com João Rocha: "enquanto eu for presidente o Sporting não voltará a ser campeão!". Hoje sabemos (como e porquê) que apenas por 2 vezes a sua vontade não foi cumprida.
Não se pense que apesar do indiscutível sucesso que João Rocha não conheceu oposição à sua passagem. Nesse âmbito foi estrepitosa e nem sempre de bom tom a disputa das eleições de 1982 com Marcelino de Brito. Como ficou célebre a crise provocada em 1980, em que desafiou uma oposição que moía mas não dava a cara, como se provou ao ter que concorrer sem adversários. Eram também muitas as suas queixas relativamente às dificuldades causadas pela falta de compreensão da tutela na resolução da sustentabilidade financeira dos clubes. Por isso dizia já há muito "É preciso redefinir o clube e encontrar uma filosofia que permita ao Sporting seguir em frente sem o perigo de fechar a porta."
O problema da sustentabilidade financeira era algo que já preocupava João Rocha desde a sua tomada de posse. Antecipando em muitas décadas as SAD´s, criou a Sociedade de Construções e Planeamento que em 9 de Março de 1974 emitiu 2.500.000 acções de valor nominal de 100 escudos. Esta, tal como todas as outras cotadas em bolsa, haviam de se esfumar passado pouco mais de um mês com o advento da revolução dos Cravos, em Abril de 1974.
Foi já cansado e doente que em 1986 João Rocha abandonaria a presidência
do Sporting, abrindo um período em que, de forma paulatina e por vezes
acelerada se foi desbaratando muito do que foi construído. Hoje,
passados estes anos, ocorre-me que a saída de João Rocha nunca foi
querida e muito menos preparada.
Não sei se João Rocha foi o melhor presidente de sempre do Sporting
porque, nos seus recentemente celebrados 106 anos de vida, há muito da
sua história que não foi vivida e testemunhada. Por isso não gostaria de
cometer o habitual erro de paralaxe de quem observa a história separada
por diferentes ângulos de observação. Mas João Rocha é hoje
considerado, e com toda a justiça, um dos maiores presidentes da
história do Sporting e ao seu tempo de presidência corresponde um dos
períodos mais pujantes da nossa história.
Seja ou não atribuído o seu nome ao pavilhão a construir nas imediações do estádio (felizmente temos uma história rica e com muita gente merecedora da distinção ) esse é um facto que a história se encarregará de confirmar. Mas se tal ocorrer só posso dizer que o nome de João Rocha ficará muito bem ao lado do estádio que tem o nome de José Alvalade.
P.S.- Ouro sobre verde seria o próprio João Rocha descerrar a placa do pavilhão...
É de facto uma homenagem bonita para se fazer ao nosso ex-presidente. Num espaço que se quer para as modalidades e para o ecletismo funcionar ainda melhor, nada mais bonito que lhe dar o nome de um dos homens que mais fez pelo ecletismo do clube.
ResponderEliminarFicarão bem os 2 J, José de Alvalade e João Rocha no mesmo espaço, perpetuando assim o imaginário e a vida sportinguista
Mais um excelente post a fazer reflectir muita gente. O meu obrigado por este pedaço de história leonina.
ResponderEliminarJPT.
Muito bom post LdA.
ResponderEliminarNão me lembrava dessas guerras em 1980...
Pelos vistos é mesmo sina do SCP ter gente que só diz mal (há aí um blogueiro que diz que dar o nome do JR ao pavilhão é mais uma medida populista da direcção e logo de seguida diz que é um nome merecido...)
Só um pormenor, corrije aí o ano da dobradinha, nesse ainda nem tinhamos nascido ;)
Frederico as grandes vitórias preparam-se com antecedência. :-)
ResponderEliminarObrigado.
"Pelos vistos é mesmo sina do SCP ter gente que só diz mal (há aí um blogueiro que diz que dar o nome do JR ao pavilhão é mais uma medida populista da direcção e logo de seguida diz que é um nome merecido...)"
ResponderEliminarJoão Rocha é uma das principais vozes críticas das sucessivas direcções do Sporting desde 1995. A esse propósito tem entrevistas publicadas e nas quais desfere violentos ataques a essas direcções. Aliás Roquette chegou a colocar um processo-crime contra João Rocha por difamação que mais tarde acabaria por retirar.
Dizer-se que é populista e logo a seguir que é merecido não é nenhuma contradição à luz daquilo que acabei de referir e do passado de João Rocha no clube enquanto grande impulsionador do ecletismo.
"João Rocha é uma das principais vozes críticas das sucessivas direcções do Sporting desde 1995."
ResponderEliminarQue estupidez de afirmação, quantas vezes falou João Rocha sobre esta direcção?
Só falta dizer que João Rocha é brunoide!
E de resto já conhecemos o resto da história: se escolhessem outro era uma merda de escolha porque não o JR etc, etc.
É este o problema dos contestatários, têm que dizer alguma coisa contra não interessa mt bem o quê. E se este fosse o tempo de JR seriam de certeza os que estariam na linha da frente no bota abaixo. Já foi assim no tempo dele, sempre houve gente assim no Sporting.
ASF
"Que estupidez de afirmação, quantas vezes falou João Rocha sobre esta direcção?"
ResponderEliminarDeclarações de Godinho Lopes em 2000, à data vice-presidente com o pelouro do património:
http://www.record.xl.pt/Arquivo/interior.aspx?content_id=22479
Entrevista de João Rocha ao Record em 2006:
http://www.record.xl.pt/arquivointerior.aspx?content_id=261197
É preciso fazer um desenho?
Anónimo das 18:02:
ResponderEliminarInforme-se melhor. Foi com esta Direcção que João Rocha voltou finalmente a frequentar Alvalade (sempre que a saúde lhe permite). O seu entendimento com Godinho Lopes é real e concreto.
Não há nesta Direcção nenhuma intenção de se apropriar da figura de João Rocha, apenas de honrar o seu legado propondo à AG o seu nome para o pavilhão, que é do Sporting e não da Direcção A ou do Presidente B.
O mérito desta proposta é inquestionável donde se percebe a frustração dos contestatários em admitir que esta foi uma excelente decisão. Para além dos argumentos críticos que surgiram, até há quem se arrogue o exclusivo de ter tido a ideia, como se esta ideia tivesse aparecido apenas ontem.
Meta na sua cabeça uma coisa de uma vez por todas: esta Direcção não tem nada a ver com o Roquetismo e o futuro haverá de prová-lo, por muito que lhe custe. O trabalho de refundação do Sporting está em curso e dará frutos, contra tudo e contra todos, mas com a determinação de todos nós.
Volte lá para as reuniões conspiratórias para estudarem a forma de fazer a Direcção cair na próxima AG que é já em Setembro e podem não ter tempo para arranjar uma estratégia. Mas tenha cuidado até lá. Não morda muito a língua não vá ter de provar do seu próprio veneno.
E em Setembro lá nos encontraremos. Pode ser que desta vez consigam obrigar a que a acta seja lida para ver se vêm mais correlegionários à AG.
P.S: LdA, infelizmente, receio que João Rocha possa não conseguir estar presente na inauguração do pavilhão. A sua saúde está muito frágil. Oxalá Deus faça com que esteja enganado.
LdA,
ResponderEliminarNeste início de temporada há pormenores que me estão a agradar profundamente. Revelam memória e reconhecimento da história do clube.
O regresso da mítica 10A ao lugar que é seu de direito e o reconhecimento de João Rocha, honra o extraordinário trabalho por ele feito em prol do clube.
Confesso que me agrada bastante a ideia de passar pela Rua Francisco Stromp, em direcção à Rua José Travassos, para, mesmo ao lado do Estádio José de Alvalade, chegar ao Pavilhão João Rocha :)
Não sei nem quero saber se esse anúncio tem intuitos populistas, para mim basta-me saber que é completa e inteiramente merecido.
P.S. Excelente resenha histórica.
LdA,
ResponderEliminarO tempo tudo apaga e para que o nome do João Rocha não pareça o de um santo vou destoar do conjunto de elogios que todos apresentaram até aqui.
Foi no tempo do João Rocha que comecei a seguir de muito perto a vida do nosso clube, tendo assistido com orgulho a todas as vitórias referidas e a feitos importantes como a meia final da Taça das Taças contra o Magdeburgo.
A criação da Juve Leo foi uma marca, o fecho do velhinho peão outra. Do outro lado a saída do Futre, para o FCP, o ponto mais negativo.
Mas os anos de 75 a 78 é preciso não esquecer foram muito conturbados e difíceis. Não nos esqueçamos que quando um Português saía do País só se podia levar o equivalente a €37,5 e qualquer transferência de património para o estrangeiro de modo licito era quase impossível.
Algumas das estratégias seguidas nestes anos foram devastadoras para o clube e produziram efeitos que, acho eu, ainda hoje não recuperámos completamente.
Falo entre outros da colocação dos nossos jogadores no Tea-Men (desportivamente ficámos com os princpais jogadores sem férias e financeiramente proporcionámos transferências financeiras duvidosas - permitindo que alguns transferissem o seu património - num período em que as desvalorizações e a inflação eram exponenciais).
Em pouco tempo ficámos muito fracos financeiramente.
Viagens pagas com madeira de construção, com a justificação de que serviriam para a edificação da bancada nova, também em nada contribuíram para reforçar o nosso clube.
Tudo isto o tempo apagou e não vejo referido atualmente, mas lembro-me na altura de andarmos furiosos com esta situação.
Claro que não havia net e a Bola e o Record só saíam 3 vezes por semana. A TV eram 2 canais e por isso as coisas discutiam-se em circuito fechado.
João Rocha deu-nos muitos títulos e projetou o nome do Sporting (daí ome do Pavilhão), mas não o confundam com um santo milagreiro porque isso não o foi e alguns mais antigos também sabem que beneficiou com o facto ser presidente do nosso clube.
SL
Excelente artigo, LdA. Este é um vintage!
ResponderEliminarGrande abraço e até já. Vemo-nos em Guimarães