É aparentemente difícil de entender como é que foi possível o
Sporting não se ter deslocado a Angola nos últimos 32 anos mas as razões não
andarão muito longe dos problemas sentidos por ambos os lados: Angola esteve
envolvida numa guerra civil que terminou há relativamente pouco tempo e o
Sporting tem vivido nestas mais de 3 décadas demasiada turbulência para se
preocupar com estratégias expansionistas e relações exteriores das quais não
deveria nunca ter abdicado. Nestas matérias, como infelizmente em muitas
outras, o Sporting trabalhou os dossiers muito pela rama, de forma
inconsequente e cujos resultados não passaram de um enunciado de boas intenções
e algumas fotografias em jornais.
Com a actual digressão a Angola o Sporting tem agora uma
nova oportunidade de voltar a por nos
carris uma ligação emocional que não se extinguiu com a independência daquele
grande País africano. Pude testemunhá-lo pessoalmente durante um período
recente da minha vida, em que tive oportunidade de conhecer um ínfima parte deste colosso
africano, onde o Sporting possui uma legião de adeptos que, tal como nós aqui
mais perto, sofriam a bom sofrer com as desventuras do nosso futebol. Seria até
o Sporting o motivo de desanuviamento num incidente em que me vi involuntariamente
envolvido e que terminou com o selar de uma vasta relação que me “obrigava” a,
sempre que voltava ao País, a ir carregado de um rol de lembranças alusivas ao
Sporting, que se estendiam desde pequenos pechisbeques para oferecer, a
encomendas personalizadas como camisolas e outros artigos do género.
Mas as oportunidades em Angola não se esgotam apenas no
cuidar da ligação afectiva aos seus adeptos. Angola tem necessidade de recursos
humanos e conhecimento em praticamente todas as áreas e o Sporting, na
actividade desportiva, que não se esgota no futebol , tem o know-how e também a
necessidade de diversificar as suas fontes de recrutamento. De ambas as
necessidades falta fazer encontrar no mesmo patamar as vontades que contribuam para tornar a relação profícua para as partes envolvidas. Pensar
que o Sporting só tem a receber e nada a dar é condenar a um fracasso e um desperdício
de energias e recursos, porque tal não será tolerável pelo outro lado. De
igual modo orientar a ligação a Angola, em matéria de cooperação, numa
perspectiva de resultados no curto prazo é não só uma perspectiva tacanha como irrealista.
Fazer nascer e vingar projectos em Angola, como em África em geral, requer uma
resiliência muito acima do que é exigido noutros pontos do globo, onde estruturas
e recursos humanos estão a um nível superior.
Para fazer vingar o nome do Sporting em Angola, dar e
retribuir dividendos, o clube tem que fazer uma aposta séria e a sério.
A sério
porque a meu ver tal implicará a deslocação de pessoal, devidamente articulado
com os recursos humanos locais e conscientes da diferente realidade que irão
encontrar. Tal pode e deve ser encarado como uma porta que se poderá abrir a
antigos atletas que agora abraçaram carreiras técnicas, como Oceano, Venâncio e
outros e que de momento se encontram sem exercer qualquer actividade, constituindo assim um alfobre de técnicos com ligação ao clube, contribuindo em simultâneo para a formação de recursos locais.
Aposta
séria porque tem que atender às especificidades concretas do meio. Essas
obrigam a um planeamento muito especifico , muito diverso do que é feito por
exemplo em Portugal para abertura das tradicionais réplicas da Academia. Muitos
dos jovens angolanos não têm, como ainda vamos tendo em Portugal, a garantia de
poder fazer o número mínimo de refeições, p.ex., o que colide com a actividade
desportiva, pese embora, como pude testemunhar pessoalmente, o assombroso espírito
de sacrifício e generosidade física com que a generalidade dos praticantes
dedicavam à actividade física. Em Angola o modelo de Academia deveria ser
repensado. Como mero exemplo a faixa etária deveria estender-se para lá dos 14
anos até ao inicio da idade sénior e
estendido o acompanhamento dos atletas, através de protocolos com clubes, de
forma a tornar o crivo mais estreito, tendo em conta que o grau de
desenvolvimento físico e intelectual, por forças das circunstâncias, tende a
surgir mais tarde.
Falei até agora apenas nas dificuldades para que os leitores pudessem aperceber-se,
de forma superficial, através de alguém que conhece um pouco da realidade
angolana, das dificuldades que envolvem o regresso do Sporting a
Angola. Mas, tal como tudo o que é raro e delicado, pode gerar lucros
substanciais. Basta para tal que numa geração se encontre um diamante como
Jordão ou Dinis, por exemplo, que, aos preços que se pagam os jogadores das suas
posições, pagariam todo o investimento realizado. Mas mesmo sem lograr pedras
desse quilate, o Sporting se for sério e for a sério para Angola, assim como
para a generalidade dos Palop´s, pode reencontrar um caminho onde já foi feliz.
Enquanto a generalidade dos seus congéneres hoje se "divertem" a dar relevo e publicidade a quem não devem e a quem não merece encontro mais uma vez aqui um excelente contributo para o clube. Razões acrescidas para continuar a ler-vos. Sl
ResponderEliminarAntónio Matias.
Excelente, como sempre, o seu artigo. Bom português, ideias claras e sucintas. É um prazer, lêr os seus posts. Bem Haja.
ResponderEliminarObrigado a todos pelos comentários.
ResponderEliminarIolando Pinto, por isso digo que "para a generalidade dos Palop´s, pode reencontrar um caminho onde já foi feliz."
LdA, este post é um tratado para aplicar às emoções que vamos sentir logo pelas 18.00H.
ResponderEliminarComo dizias no post anterior, ser Sporting Clube de Portugal tem um significado maior do que Sporting de Lisboa (seja quem for este...). Para o Sporting por toda a sua história esse Portugal incluía de forma muito vincada toda a Diáspora Portuguesa.
Sporting Clube de Portugal era, Timor, India, Macau, Cabo Verde, etc., etc., para lá das ex-colónias somos um país, um Portugal de milhões de emigrantes, Sporting Clube de Portugal é também EUA, Canadá, Venezuela, Alemanha, Suiça, França, enfim uma infinidade de destinos onde existe Sporting.
Eu nasci em Maputo e comecei a minha carreira de espectador nos pavilhões de Lourenço Marques a ver "derbys" de basquetebol entre a Académica e o Sporting, isto era Portugal.
Os clubes nacionais foram muito felizes nesses destinos e existem laços que são impossíveis de apagar.
Descreves bem as dificuldades que há em implementar algo em Luanda/Angola, mas há no Sporting grande conhecimento sobre isso, falo de Manuel Fernandes que trabalhou lá durante bastante tempo e será um conhecedor perfeito de todas as realidades.
É obrigatório dar esse passo, em Angola, Moçambique, Cabo Verde, etc., mas é também obrigatório não errar, não desiludir será um investimento grande mas África sempre nos devolveu com juros.