Domingos e a peçonha do Sporting
A vida colocou-me fora de jogo no momento em que ocorreu o despedimento de Domingos. O que acabou por confirmar, no que a este blogue diz respeito, que ele é muito melhor quando pode contar com o contributo de outros que não apenas o meu.
Sei que a questão foi já aqui debatida e bem escalpelizada quer pelo Virgílio quer pelo LMGM e com a indispensável colaboração dos leitores. Mas, mesmo assim, não resisto em voltar ao tema, deixando a opinião de alguém que viveu o episódio como outsider, grande parte em diferido e com quase total afastamento emocional, dadas as circunstâncias em que me encontrava.
A peçonha do Sporting
A quase unanimidade dos cronistas, "fazedores de opinião", e até a, pasme-se!, comentadores políticos mais ou menos ébrios, tenderam a considerar o Sporting, "máquina trituradora de treinadores", como o responsável pelo falhanço (quanto a mim mais que óbvio) de Domingos à frente do Sporting. Até mesmo os que, simultaneamente consideravam que a imprensa era, em regra, benévola para ele. Para isso não hesitaram, no que está está entre uma falácia bem urdida e de quase total ignorância do que é que é o jogo de futebol, em misturar o exemplo do despedimento de Robson com o actual, com se fossem comparáveis. No fundo quiseram colar ao Sporting a peçonha de um clube permanente derrotado interiormente, o que está longe ser verdade e nada tem a ver com os factos que conduziram ao afastamento do treinador. Tentou-se fazer de uma questão de competência um karma ou até uma condenação perpétua. Infelizmente são muitos os Sportinguistas que caem neste tipo de patranhas, que, em última análise, produzem os efeitos pretendidos: minar a auto-estima e a confiança, por os Sportinguistas a acreditar que é preciso um milagre para voltar a ganhar. E como por estes tempos há muito que não se vêem milagres...
O que podia fazer o Sporting?
Peço desde já a quem lê este parágrafo um favor difícil de pedir a um Sportinguista: que esqueça os nomes dos actuais dirigentes do Sporting, tal é a "politização" das conversas sobre o tema . Fosse o actual presidente Manuel ou António, o que se deveria fazer perante a derrocada da equipa, espelhada na despedida do campeonato, a esquálida prestação na Taça de Portugal e, pior, o rotundo falhanço na Taça da Liga, perante adversários tão frágeis? Mais, o que fazer perante exibições a denunciar um paupérrimo trabalho técnico-táctico?
É legitimo pensar que Domingos seria capaz de fazer um reviralho no infeliz momento em que a equipa caiu, tal como o seu contrário. Ambas as crenças são legitimas, mas não o são mais do que isso: crenças que carecerão de prova. Obviamente que quem tomou a decisão descreu das condições de Domingos para o fazer. Disso ou da possibilidade do treinador executar a tarefa em tempo útil. Isto porque o grande objectivo da época não era única e exclusivamente ser campeão, mas semear o terreno para futuras conquistas, reduzindo a diferença para os da frente.
Ora o que estava a acontecer era algo de muito diferente, para pior: depois de um enorme investimento, dando a Domingos o que a muitos foi negado, o Sporting não só não colou aos da frente como ficou atrás dos que habitualmente só nos vêem as costas na tabela classificativa. Como a percepção deste facto escapa à maior parte dos cronistas e analistas eu até compreendo, mas como escapa aos Sportinguistas é que me é difícil entender. O Sporting pode perder o actual campeonato mas não pode perder o futuro. E que treinador do Sporting beneficiou de retaguarda mais forte, dos gabinetes à bancada, que Domingos?
A decisão de despedir Domingos foi tudo menos confortável para a SAD, obviamente. Ter-lhe-ia sido mais fácil ficar "atrás" do treinador. Há evidentes perdas financeiras associadas. Há a leitura "politica" e a correlação de forças internas, nunca negligenciáveis. Mas a continuidade de Domingos, e a continuar esta série de resultados, significaria uma evidente mensagem de desresponsabilização para o balneário, inadmissível num clube como o Sporting. Significaria que os objectivos traçados não passariam de enunciados miríficos sem qualquer colagem ao mundo real e cuja contabilidade ficaria sempre em aberto para redefinição em função dos resultados, o principio para tornar a derrota suportável e cómoda. Isso seria o mesmo que abdicar de uma presença condigna na Liga Europa e manter a equipa numa letargia que poria desde já meia Taça de Portugal a caminho de Coimbra.
As direcções elegem-se também para tomar decisões difíceis e se, como parece mais do que óbvio, Domingos não estava a ser capaz, e se isto se tornou evidente para os dirigentes, estes não fizeram mais do que a sua obrigação. Até onde era admissível deixar o Sporting cair?
A Domingos o que é de Domingos
Ninguém poderá tirar o mérito do trabalho de Domingos, que o levou a ser considerado o melhor treinador para o actual Sporting. Ou mesmo negar-lhe vitórias futuras noutros lados. Fui um dos seus defensores e, à luz do que sabia então, voltaria a fazê-lo. Mas foi também Domingos que me desmentiu. Não o considerarei o único culpado, termo que considero de todo desajustado ao futebol e aos factores aleatórios que lhe estão ligados.
Mas é, de forma que me parece difícil de desmentir, um dos principais responsáveis pela actual situação do Sporting. Responsabilidade que obviamente deve ser repartida por todos os que construíram o actual plantel, especialmente por nele estarem incluídos jogadores que eram considerados pilares - Rodriguez, Izmailov, Jeffren e Bojinov - e que não estavam em condições físicas de o ser. Mas isso, por si só, não explica as demais lesões musculares, que afectaram quase todo o plantel, a falta de respostas para as dificuldades impostas pelos adversários, a falta de um modelo de jogo que servisse as necessidades de uma equipa que tem a obrigação de vencer quase todos os jogos. O Sporting, mesmo nos seus melhores momentos, quase nunca conseguiu ser uma equipa dominadora e autoritária.
O Domingos visto noutros lados, especialmente em Braga, raras vezes foi visto em Alvalade. A verdade também é que o Sporting, por muito que queiram transformá-lo, ainda não é o Braga, como o demonstram semanalmente os adversários, pela forma como escolhem jogar connosco. O Domingos sereno perdeu-se, quanto a mim, em 2 momentos cruciais da época: quando levamos 3 secos no jogo de apresentação e após a derrota com o Marítimo em casa. Domingos, que anteriormente tinha posto a equipa a jogar como devia ser contra a Juventus e até contra a Olhanense, hesitou e abdicou do que pareciam ser as suas convicções, parecendo tomar o caminho mais fácil, que era ir de encontro à opinião da bancada.
Nenhum treinador está a salvo dos maus resultados, mas Domingos não coleccionou apenas estes. Há mais de dois meses que àqueles foi adicionando exibições tristes juntamente com um ar de descrença em si próprio e nos seus comandados. Jogar mal e não conseguir resultados é uma mistura explosiva que raras vezes não produz os seus efeitos. Isto é igual para ele como será para Mourinho ou Guardiola, que disputam justamente entre si o titulo de melhor do mundo na sua classe. Porque é que no Sporting haveria de ser diferente? "Só" porque não ganha há muito ou porque no passado despediu quando não devia? Repito: Até onde era admissível deixar cair o Sporting?
Porra, está perfeito.
ResponderEliminarA tua opinião faz mt falta, LdA... Não é ao "ANorte"... É a td a blogosfera leonina...
Abraço!
O texto mais lúcido que li sobre este tema. Parabéns.
ResponderEliminarCinco estrelas! Seis para as notas avulsas :)
ResponderEliminarSL, MTP
Parabéns mto bom.
ResponderEliminarMto bom e à distancia do acontecimento ainda melhor ler esta opinião.
ResponderEliminarSL
Parabéns pelo post
ResponderEliminarÉ sempre com grande lucidez e sabedoria que escreve sobre o Sporting
concordo em tudo e a questão do pinto da costa tambem já me tinha passado pela cabeça, se ele esta a dar importância é porque existe algo.
mt bem escrito!
ResponderEliminaristo tem e deve ser o Sporting!
saudações leoninas!
é mt bom ler quem efectivam/ reflecte e vive o Sporting. Obrigado
ResponderEliminarVamos (uma vez mais) esperar que a situação melhore, agora com Sá Pinto.
ResponderEliminarMas já não digo nada.
A inclusão de Polga na equipa preocupou-me sobremaneira. Foi (uma vez mais) o pior jogador do Sporting.
Contratar numa só época 18 jogadores, dá que pensar!!!!!
18 jogadores, ainda que baratos, ficam sempre em muitos milhões de euros.
Espero que para o ano o Sporting só compre 3 ou 4 jogadores, mas que efetivamente façam a diferença.
DUARTE
Bom texto, sóbrio mas gostava de saber o que pensa da escolha do Sá, neste momento.
ResponderEliminarMais uma vez roça a perfeição Leão de Alvalade. Parabéns!
ResponderEliminarA parte em que sublinha a coragem que a direcção teve ao demitir Domingos, já que seria confortável manter o treinador que reunia desde inicío grande apoio dos adeptos, é muito bem observada.
http://quintadelduque.blogspot.com/2012/02/sera-so-treinador-e-direccao.html
Muito bom post LDA.
ResponderEliminarPedro M
Texto para ser lido, relido e absorvido.
ResponderEliminarFantástico!
Parabéns.
SL
saint
LdA,
ResponderEliminarObrigado pelo texto.
Haja Sportinguismo, coragem e bom senso.
Assino por baixo, completamente.
Fiquei incrédulo com tantas críticas: estavam a espera de quê? do dia em que estivéssemos a 20 pontos do Braga...?!
O Sporting tem de entrar para dominar e ganhar. Erros do passado não servem de ponto de comparação.
Está perfeito.
Um abraço,
Miguel
Sou contra a forma como se chega ao despedimento de Domingos, mas esta análise é bastante lúcida e coerente no pensamento.
ResponderEliminarÉ assim que o Sporting (o seu futuro) tem de ser pensado.
Durante alguns dias pensei que era o único a andar contente por o Domingos ter ído embora afinal nao estava só, grande texto.
ResponderEliminarBasta dizer que ontem foi a primeira vez que a imprensa fez enfase soubre a actuaçao do treinador do sporting (esperavam um retundo falhanço do Sá) quanto a Domingos andou 8 meses a enterrar o sporting e nem uma critica negativa. Facto estranho, dado que a imprensa adora bater no sporting e no seu treinador. Ora se não bateu, nao foi por influencia do sporting, porque a sua influência perante a imprensa é nula. Já vi despedir muitos treinadores e nunca vi a imprensa por-se ao lado do treinador como agora, porque será??
Espectáculo de texto! Obrigado.
ResponderEliminarSou suspeito por nunca o futebol das equipes do Domingos me ter convencido a ver nele o treinador que diziam ser.Para mim era futebol de equipes de conta-ataque e nunca de equipe que se quer dominadora.Mas enfim acabou e,o Mingos para nós só ainda nos diz respeito pela pesada herança que nos deixou desportiva e económicamente,não me dixa qualquer saudade.Concordo portanto,com aplausos,com a opinião e as razões aduzidas neste post.Análise fria,distânciada o quanto baste para ser serena e muito coerente.Muito,mas muito boa!
ResponderEliminarQueria dizer "contra-ataque"e "deixaqualquer"
ResponderEliminarAbraço e votos de rápido restabelecimento!
Está tudo e muito bem dito!
ResponderEliminarMomento de inspiração, onde a verdade salta, nua e crua, ainda que doa...
ResponderEliminarO meu aplauso e o meu obrigado. Sportinguismo é isto mesmo...
Peço mais, noutras áreas, sobejamente conhecidas mas sempre "tabus" no Sporting...
Fortes e reconhecidas SL
Agradeço os comentários e o apoio.
ResponderEliminarAcrescentaria que, tal como a generalidade dos Sportinguistas, não sinto qualquer satisfação pelo despedimento de Domingos. Não deixa de significar um falhanço, um retrocesso pelo menos momentâneo, uma vez que teremos de aguardar pela implementação de novas ideias do treinador, o que nem sempre é fácil quando o tempo para treinar é escasso.
Mas, à medida que o tempo passa, mais convencido fico da inevitabilidade da decisão tomada, até porque, no discurso de Domingos, havia muito pouca auto-critica, o que revela que, para ele, o problema parecia ser sempre dos outros. Ora quem via o Sporting jogar era obrigado a reconhecer que alguns adversários pareciam melhores que nós muito porque as suas equipas, com menos valor individual, apareciam mais capacitadas e melhor trabalhadas para enfrentar os diversos momentos do jogo.
Quanto à questão do que penso do Sá Pinto, acho que ainda é cedo para me pronunciar, uma vez que não costumo ver os júniores jogar para perceber que princípios defende. Quando vi a eliminatória perdida com o Inter vi muita determinação e garra por parte dos miúdos, mas uma equipa aqui e ali muito partida entre sectores, certamente fruto do trabalho do Inter, mais experiente.
Para já fico-me com o texto do LMGM:
http://anortedealvalade.blogspot.com/2012/02/handicap.html
A verdade é que o SCP ainda não ganhou um unico jogo aos 8 primeiros classificados do momento (logicamente, excluindo o próprio SCP da equação) nesta época futebolistica.
ResponderEliminarAs vezes nem tudo o que parece é.
ResponderEliminarA questão do Domingos não é assim tão clara.
Volto a referir houve equipa até ao Natal, depois não houve em 2012.
Durante esta semana num programa televisivo alguém afirmou que os objectivos reias da Sad não seriam bem os que eram transmitidos para a comunicação social e eu cada vez mais acredito nisso.
Para os dirigentes do Sporting este não seria um ano de transição, mas sim um ano para tentar vencer a liga.
Não restam duvidas sobre isso, depois do jogo do Benfica, Domingos ficou só, começou a ter umas conferências de imprensa estranhas e os jogadores apareciam em campo completamente desmotivados.
Os Sportinguistas precisam de se mentalizar que não é com constantes revoluções que vamos lá.
Por exemplo ainda ninguém confirmou se Sá Pinto é uma solução a prazo ou não.
Será que para a próxima época vai haver outra revolução?
Iremos de revolução em revolução até a destruição final?
de todos os acontecimentos da semana, fica a nu a liderança fraca do clube, um presidente que ou é mentiroso compulsivo ou é um fantoche nas mãos daqueles que nunca perceberam nem perceberão que o Sporting não pode ser um palco para exibir vaidades ou interesses pessoais que colidam com os interesses da instituição.
ResponderEliminarrecuso-me a comentar as questões técnicas relativas à prestação do ex-treinador, porque aquilo que me preocupa mesmo nesta altura é a evidencia que fica de o meu clube ser um clube sem liderança e ao sabor de grupos e grupinhos que em nada engradece o nome do Sporting e isso é que verdadeiramente me interessa.
Os artigos rebuscados sobre avaliações tecnicas do ex-treinador e sua avaliação não me parecem verdadeiramente interessantes ou prioritários, mas sei que são muito mais populares.
Pedro O.
ResponderEliminarO que escreveste acima pode ser muito forte mas não tem qualquer suporte se não demonstrares com exemplos concretos para que assim possa concordar ou não com o que escreves, que, da forma como foi feito tanto serve para o Sporting como para outra entidade qualquer.
Quanto aos "artigos rebuscados" sobre a avaliação técnica do treinador gostava de perceber que outras razões que não estas podem explicar os resultados e sobretudo as exibições que o Sporting vinha fazendo.
o texto tem partes que roça o patetico....mas foi bem encomendado
ResponderEliminarque bela encomenda...
ResponderEliminarConcordo Amigo... Parabens pelo texto!!!
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