O jogo de apresentação de sábado assemelhar-se-à à experiência de alguém que, cheio de sede, bebe de forma incauta e sôfrega um copo de um óleo viscoso e intragável pensando tratar-se de um copo de água fresca. É uma experiência desagradável e, não sendo letal ou incapacitante, e colhidos os devidos ensinamentos, constituirá memória suficiente para que o erro não se repita no futuro.
Apesar de traumática a derrota ante o Valência pode também ter sido uma derrota importante, quem sabe a mais importante da época. Por maior que tenha sido a ferida no orgulho nada perdemos, não faz qualquer sentido pensar o contrário. Faz sentido é perceber que há muito trabalho pela frente, lembrando que o forte Valência de ontem foi também o mesmo que na Áustria levou 1-4 do Rapid. É ainda cedo para cortar os pulsos mas um banho de fria realidade não fará mal a ninguém. Há uma equipa para construir e temos que estar preparados para as contrariedades.
O que foi afinal assim tão diferente do jogo de Toronto? (Quase tudo!)
1- Começamos desde logo por ter mais olhos que barriga. Seria mais aconselhável, nas actuais circunstâncias, ter escolhido um adversário menos exigente.
2- Depois há que olhar para o adversário, muito melhor preparado e orientado que a Juventus. E é-me difícil imaginar a postura do Valência de ontem, exibida desde o primeiro minuto, sem que tenha tido conhecimento prévio da forma como jogamos. Isto é, seguramente que houve o visionamento prévio do jogo com a Juve. Fatalmente para nós o Valência levou a sério o jogo e a sua atitude competitiva nada teve de particular ou amigável, como se costumam chamar estes jogos.
3- O ambiente feérico e de grande intensidade emocional certamente também terá pesado, sobretudo na concentração, em particular nos momentos iniciais, onde até sofremos 1 golo e podíamos ter levado mais. Já o Valência atirava a bola ao poste e nas cabeças dos jogadores estavam as emoções das palmas de um estádio cheio e vibrante.
4- Mas olhemos sobretudo às razões que têm a ver estritamente com o futebol:
Das grandes virtudes apontadas no jogo com os italianos - a forma como encurtamos o campo, subindo a defesa e a pressão exercida sobre o adversário – parecem hoje merecer a condenação geral. E de certa forma com razão porque qualquer sistema, por melhor que seja em teoria, não resiste a uma má prática.
A linha da defesa esteve subida mas uma deficiente articulação, em particular do lado esquerdo, ( a escolha deste lado não deve ter sido inocente, dai a conclusão de que Unai Emeri já nos tinha visto jogar) fazia desaparecer o efeito do fora-de-jogo. A agravar os erros na extrema defesa a pressão sobre o adversário não era feita ou chegava sempre tarde, em particular ao portador da bola na hora, permitindo constantes lançamentos nas costas dos nossos defesas. Ao contrário dos italianos, os levantinos não optaram por tentar jogar de pé para pé, em passes mais curtos, mas com simples lançamentos directos, escapando à acção, mesmo que deficiente, dos nossos médios. Sem fora-de-jogo que nos valesse e tendo a desvantagem dos nossos defesas ainda terem que efectuar a rotação para correr atrás dos expressos de Valência fomos sendo batidos consecutivamente, de forma confrangedora. É fácil culpar apenas a defesa, mas o erro é essencialmente colectivo.
Mas o futebol, na sua imprevisibilidade que o torna tão apetecível pelo mundo inteiro, pregaria as suas partidas. Apesar de parecer eminente um golo resultante de um desses lançamentos directos, o golo inicial surgiria de um lançamento lateral numa série de falhas individuais a roçar o caricato. Não deixa de ser "interessante" notar que, logo agora que tínhamos a altura na defesa tão pretendida pelos adeptos, sejamos goleados por uma equipa de avançados minorcas.
Podia ser um jogo interessante se conseguíssemos dispor das mesmas armas. Mas sem a mesma velocidade na frente e com Rinaudo e Schaars sufocados, os lançamentos longos nunca foram opção. E sem apoios e sem linhas de passe poucas vezes conseguimos progredir e a bola voltava invariavelmente aos pés do Valência, recomeçando logo aí nova tortura para as bancadas repletas de adeptos atónitos.
O que esperar a seguir
O papel dos adeptos
Não é ainda tempo de conclusões, por nítida extemporaneidade. É isso que espero dos adeptos para os jogadores acabados de chegar, obviamente para o treinador e também para os que já estavam no plantel e que são, alguns deles, objecto de ódios de estimação a merecer estudo psiquiátrico. Para os que querem e exigem um novo começo, uma nova atitude, uma nova página, que tal começarem já hoje por abandonar as velhas posturas? Assobiar jogadores num jogo de apresentação, com um mês de preparação, dificilmente pode ser encarado como um contributo para o sucesso. O ano passado, em altura semelhante, ganhamos a grandes equipas, ganhamos na apresentação ao Lyon e a época foi o que se sabe. Não é a opinião dos adeptos sobre os jogadores que mais conta para termos sucesso, desde que das bancadas não se tolham os jogadores e não se faça da bola nos pés um ferro em brasa. Alvalade tem de voltar a ser um inferno mas apenas para os adversários e não para os nossos. Quantos treinos e jogos tem este grupo em conjunto? Quantos dos jogadores de quem mais se espera acabaram de chegar ou ainda nem treinaram?
Sempre fomos, do grupo de candidatos ao título onde não nos podem excluir, o que parte atrás. Quem deixou de pensar o contrário vive em delírio pouco recomendável. Esse é aliás um estatuto que nos convém como estratégia. A época será longa e difícil, a menos que queiramos acabar com ela já por não termos, como adeptos, estofo para aguentar as contrariedades e os reveses que, inevitavelmente, vão surgir.
O papel do treinador
Obviamente que o foco estará agora no treinador e na resposta que dará de seguida. Ao contrário do que aconteceu o ano passado, quando surgiram as primeiras contrariedades, não espero que Domingos desate e trocar de jogadores e estratégia, prolongando a pré-época para lá do Natal. Espero uma resposta serena, própria de quem confia na qualidade do seu trabalho, na sua competência e na da sua avaliação sobre a qualidade dos jogadores ao seu dispor. Agrada-me sobremaneira verificar que Domingos não pensa com a cabeça da bancada, mas sim apenas com a sua.
A minha posição pessoal
A derrota de sábado não me soube bem mas não me apanhou desprevenido nem me retirou a esperança de ver o Sporting a caminho do lugar que merece. A minha primeira e única exigência mantém-se actual e possível; encurtar as distâncias do fosso em que nos deixamos cair nos últimos anos, sendo o futebol de qualidade o caminho mais curto para o alcançar. Não acredito em fatalismos, mas sim em competência.
"Depois há que olhar para o adversário, muito melhor preparado e orientado que a Juventus. E é-me difícil imaginar a postura do Valência de ontem, exibida desde o primeiro minuto, sem que tenha tido conhecimento prévio da forma como jogamos. Isto é, seguramente que houve o visionamento prévio do jogo com a Juve. Fatalmente para nós o Valência levou a sério o jogo e a sua atitude competitiva nada teve de particular ou amigável, como se costumam chamar estes jogos."
ResponderEliminarEstá aí a chave do jogo do Valência. Quando, em Alvalade, vi os lançamentos longos (geralmente vindos da lateral direita deles, após uma ligeira troca de bola na defesa, a mando do seu treinador que estava constantemente a dizer ao Diego Lopez para não pontapear a bola) para o nosso lado esquerdo, a posição da sua equipa logo a pressionar a nossa saída da bola pensei o mesmo que tu. Eles preparam o jogo.
E o facto de terem perdido com o Rapid pode ter levado a isso, pois o espaço para Emery já não é muito. Talvez o torneio de Cadiz também faça ao Sporting o que Rapid fez ao Valência.
"Seria mais aconselhável, nas actuais circunstâncias, ter escolhido um adversário menos exigente."
Será que o Málaga de Nistelrooy, Toulalan, Duda, Demichelis, Carzola, Julio Baptista, Mathijsnen, Maresca, Joaquim, Buonanotte e, acima de tudo, de Pellegrini (já com mais de 9 meses de casa) é o melhor adversário?
Uma derrota não é preocupante (nem duas, nesta fase), mas sabemos como são os estados de espírito leoninos e cabeças dos nossos jogadores que vêm de duas épocas desastrosas e claramente desmotivadoras.
Ainda estou para perceber como é possivel assobiar daquela forma o Postiga, por exemplo, depois de 1 epoca que fez 15 golos...
ResponderEliminarE já agora, o melhor central em campo, de longe, foi o... Polga. Se calhar foi motivação pelos assobios também.
E o contraste entre aplausos no inicio para assobios no intervalo, ao Oniewu? 49000, quase? mais valia sermos menos mas para apoiar incondicionalmente, digo eu...
LdA
ResponderEliminarAnálise na linha habitual: extremamente lúcida.
Para mim mais que a derrota, pior que a exibição, foi ver perto de 50000 almas entrarem naquele estádio plenos de esperança e orgulho e a equipa não ter conseguido dar-lhes o que eles queriam: golos, alegria, pretextos para voltarem a estar todos presentes no jogo com o Olhanense e seguintes.
Viajando pela blogosfera, tirando meia dúzia de radicais, vejo com satisfação que a maioria dos blogs mais representativos, não deixando de apontar as deficiências demonstradas pela equipa, fazem uma análise calma e confiante do que aconteceu no sábado, na altura da época em que nos encontramos, e na esperança futura.
Penso também que a comunicação do Presidente foi oportuna e demonstrativa da confiança no trabalho que está a ser efectuado.
Esperemos que o Ramon Carranza nos devolva o entusiasmo, sem euforias, que vínhamos vivendo.
Óptima análise em todos os aspectos!
ResponderEliminarA desconcentração e passividade da equipa num jogo de apresentação e de estádio cheio, em oposição à atitude e profissionalismo com que o Valência atacou o jogo, depois de sofrer uma pesada derrota com um fraco adversário, além falhanço colectivo do Sporting e a qualidade do adversário são, também para mim, as grandes causas do resultado e da exibição do Sporting.
É vergonhoso o que alguns adeptos escreveram e como muitos se manifestaram em Alvalade. VERGONHOSO!
Os jogadores e a equipa:
Polga é um dos melhores, Postiga um jogador fundamental no plantel, Pereirinha um valor seguro e fiável no plantel.
Preocupa-me muito muito a qualidade das laterais. Já o disse aqui mais de uma vez antes deste jogo. O lado esquerdo é vergonhoso mas o direito também me preocupa muito. E para mim os dois melhores centrais são Polga e Rodriguez.
Izmailov não pode com as pernas ou então está com problemas. E é uma grande perda!
Falta coesão ao meio campo. Falta magia. André Santos esteve muito bem! Falta-nos um 10 de categoria inequívoca que jogue a época inteira ao mais alto nível. Ou aparece Matias ou vamos ter esse problema.
E falta um matador. Bojinov é o único com condições para ser mas não percebo a falta de ritmo e o alheamento com que parece estar.
Mas o falhanço foi colectivo!
Achei melhor colocar aqui o meu comentário. Aí vai ele:
ResponderEliminarO Sporting desiludiu. È realmente preciso dar tempo ao tempo. Mas não se pode demorar muito ou então teremos mais um ano completamente comprometido. Não é na competição que se devem fazer ensaios. Senão acontece como no passado: perdemos.E a competição a sério está ai dentro de umas semanas.
No jogo de apresentação Domingos apresentou 7 jogadores da equipe velha e somente 4 jogadores novos. È manifestamente pouco para quem adquiriu 14 reforços. Temos mesmo que quebrar com o passado e a começar na defesa. No ano passado aconteceram cenas incriveis porque o sector defensivo não tinha capacidade e competencia para as resolver. Neste jogo aconteceu o mesmo. Como é possivel que a defesa se deixe apanhar em contra-pé, desconcentrada, sem rapidez de recuperação e força no corte? O que fizeram Carriço, Evaldo ou João Pereira pra melhorar erros do passado? Vi muito pouco. Depois o ataque foi confrangedor. Mais uma vez vimos Postiga a inventar e sem tirar qualquer proveito disso mesmo. Muito fraquinho. Não se percebe como a aposta não vai diretinha para o Rickie que nos custou 5 milhões. Não queremos que ao rapaz sejam postos rotulos de "caicedo" ou "pongole", daqui por uns tempos.E o meio campo tem de ser mais forte e disciplinador do jogo. Precisa-se de patrão. Será o outro holandês?
Vamos esperar calmamente mas pede-se a Domingos para no treino desfazer duvidas testando inclusivamente lances de maior grau de dificuldade e pondo a resolve-los (ou não) jogadores da colheita velha e os novos reforços . A escolha ate pode ser dificil mas quanto a mim não merece duvidas.
Fernando Sousa,
ResponderEliminar"No ano passado aconteceram cenas incriveis porque o sector defensivo não tinha capacidade e competencia para as resolver."
Ou talvez porque foram (mal) treinados para fazer aquilo.
"Como é possivel que a defesa se deixe apanhar em contra-pé, desconcentrada, sem rapidez de recuperação e força no corte? O que fizeram Carriço, Evaldo ou João Pereira pra melhorar erros do passado? Vi muito pouco."
1 jogo mau em 4, não me parece uma má média para esta altura da época e em que entraram 14 jogadores novos e uma equipa técnica nova.
"Precisa-se de patrão."
Não é verdade. É preciso é ganhar rotinas.
Havia uma clara diferença de qualidade entre as duas equipas(não foi logo ai a melhor escolha para jogo de apresentação),e isso reflectiu se no resultado (na primeira parte foram 3 mas podia ter sido mais).
ResponderEliminarÉ preciso repensar sobretudo a estratégia que tem sido implementada na defesa(já contra a Juventus se tinha percebido alguns problemas defensivos).E pensar em um ou dois reforços para esse sector(um central pelo menos tem de vir).
Há certas situações que não se mascaram com treino.
Os jogadores são o que são e não há nenhuma formula mágica que os transforme de um dia para o outro naquilo que eles nunca serão.
Falta nos uma referencia na defesa há anos e não é só de agora.
Esperemos que isto tenha servido de alerta.